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Projeto político pedagógico: (re)construção entre as práticas do trabalho docente

Claudia Oliveira Santos

Cláudia Oliveira Santos

Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal de Minas Gerais, mestrado e doutorado em Programa de Pós-Graduação Conhecimento e Inclusão Social em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais . Diretora de estabelecimento da primeira escola da infância de tempo integral de Belo Horizonte. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Ensino-Aprendizagem, atuando principalmente nos seguintes temas: Educação Infantil, ensino-aprendizagem e formação docente.

Contato: claudia.osantos@edu.pbh.gov.br

Introdução

A proposta deste trabalho é compreender como a Escola Municipal Monteiro Lobato (re)elabora suas práticas de mais aprendizagem, expressando uma intencionalidade que imprime em suas metas o compromisso com a transformação social.

O Projeto Político Pedagógico-PPP é a identidade da instituição educacional, orientador de ações que promovam o planejamento, a avaliação nos processos de ensino e aprendizagem, capaz de traçar planejamentos que representam as reais necessidades e interesses da instituição escolar. 

Nesse sentido, o Projeto Político Pedagógico exige da gestão escolar, da coordenação pedagógica e do corpo docente a necessidade de rever metas, tornando-o assim um documento em movimento (re)construído, ou seja, direcionar ações entre o que se é, e o que deve ser e o que se quer ser.

Ressalta-se que o diálogo deve ser mediado com a participação dos membros da comunidade escolar, com escuta de famílias, professoras, crianças, demais funcionários, potencializando a reflexão coletiva como fundamental para a reafirmação do princípio da autonomia, no exercício da sua função democrática e que influencia diretamente o trabalho escolar.

Para tanto, o PPP foi direcionado baseado na afirmação de Gandin (1994,) que destaca a relevância desse diálogo entre interesses, conflitos e desejos, porém devem ser conduzidos para responder para quê e para quem, com o propósito de sair de um projeto operacional para tornar-se um projeto político. Portanto, a partir desse entendimento, o PPP constitui-se por legislação, currículos, conteúdos, metas e, também, a característica instituinte da cultura organizacional, que permite o funcionamento da escola e o mais relevante promover a permanência e o sucesso de mais aprendizagem da criança.

Referencial teórico

O Projeto Político Pedagógico, de acordo com Souza e Corrêa (2014), compõe o nome do documento, de forma que o processo de ação-reflexão-ação exige o esforço conjunto e a vontade política do coletivo escolar

P – projeto, porque reúne propostas de ação concreta a executar durante determinado período de tempo. P – político, por considerar a escola como um espaço de formação de cidadãos conscientes, responsáveis e críticos, que atuarão individual e coletivamente na sociedade, modificando os rumos que ela vai seguir. P – pedagógico porque define e organiza as atividades e os projetos educativos necessários ao processo de ensino e aprendizagem (SOUZA e CORRÊA, 2014, p.13)

A construção do Projeto Político Pedagógico – PPP, pelas Instituições Educacionais é uma necessidade sem precedência, disposto na Lei de Diretrizes e Bases – LDB nº 9.394/96, especificamente nos Artigos 12, 13 e 14.

A forma dessa Lei está diretamente posta no artigo 13, que reserva ao docente a incumbência, entre outras, de participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino, elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino. No artigo 14, em que são definidos os princípios da gestão democrática, o primeiro deles é a participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola.

O PPP insere-se no desenvolvimento de uma política pública de educação, que envolve ações cooperativas para responder à necessidade de aprofundamento da compreensão dos processos da gestão democrática educacional. A proposta de entendimento possibilita a interface com os aspectos teóricos em articulação com os problemas concretos, valorizando a produção de saberes construídos no próprio trabalho, e ampliando o conhecimento educacional.

No tocante a reelaboração do Projeto Político Pedagógico da Escola Municipal Monteiro Lobato propõe uma dialética entre teoria e prática, valorizando e ampliando o conhecimento, por meio da reflexão, análise e problematização. Esse conhecimento na ação pode ser compreendido pelo conhecimento implícito, interiorizado, que mobiliza o dia-a-dia, configurando um hábito.

Dessa forma, os eixos que determinam os conhecimentos exigem aprofundar a compreensão da educação escolar como direito social  e como instrumento de emancipação humana no contexto de uma sociedade com justiça social. Cada vez, mais a Escola Municipal Monteiro Lobato, por meio do PPP estabelece o direito à educação, visando a qualidade social, por meio de práticas caracterizadas pela transparência, pelo trabalho coletivo, pela participação da comunidade nas decisões e pela postura ética, crítica e criativa, pelo compromisso da escola e da educação escolar.

Considerando a complexidade do PPP, a relevância do trabalho docente e a sua constante (re)construção traduz em boas práticas, uma vez que orienta o planejamento bem como aspectos técnicos que facilitam a avaliação e o entendimento do universo da Escola Municipal Monteiro Lobato.

Objetivos

– Produzir conhecimentos a respeito da necessidade e importância da atualização o Projeto Político Pedagógico;

– Elaborar práticas de mais aprendizagens em contextos presenciais.

Metodologia

A metodologia utilizada para (re)organização do Projeto Político Pedagógico, implicou na pesquisa-ação que se beneficia da administração do conhecimento, ou seja, como o PPP baseia-se na prática, torna-se relevante fazer a ligação tanto da teoria para a transição da prática quanto da prática para a transformação da teoria.

Desse modo, a pesquisa-ação centra-se na prática, na ação, na experimentação social, que pretende intervir com o intuito de modificar uma situação social ou psicossocial. De fato, a pesquisa-ação provoca mudança para corrigir, de maneira eficaz, uma situação que se tornou necessário fazer mudança (Lakatos e Marconni, 2019).

Para tanto, foram formadas equipes de professoras para analisar as seguintes categorias[1]: Revisão do texto base 2018; Educação étnico-racial, Deficiência no contexto escolar; Perfil da comunidade escolar; Escola Integrada/Appia; Legislação vigente de conteúdos e normas de funcionamento Escolar; e Atividades em novos contextos.

O processo de composição das equipes[2] docentes foi seletivo intencional. Nesse sentido, o agrupamento das professoras se deu para integrar a Educação Infantil e o Primeiro Ciclo. Determinou-se também que aquelas que tivessem dois BM[3] ou extensão de jornada[4], participariam de dois grupos diferentes. Vale destacar que a possibilidade dessa organização se deu em virtudes do teletrabalho contínuo, presente nos anos de 2020 e início de 2021 e atualizado em 2022.

As orientações das equipes de trabalhos se deram pela direção e coordenação pedagógica, baseado em articulações dos aspectos políticos, pedagógicos e de certa forma subjetiva, que constituem os processos de trabalho docente. Desse modo, a função apoio ao grupo é chave para a instaurar diretriz e dispositivo para ampliar a capacidade de reflexão, de entendimento e de análise de coletivos, que, assim, podem qualificar sua própria intervenção, sua capacidade de produzir mais aprendizagem.

No primeiro momento, buscou-se resgatar, na literatura, alguns aspectos com relação a importância do PPP a interferência da equipe no processo de mais aprendizagem, de modo a obter um embasamento teórico, bem como abranger a totalidade do problema investigado. Os encontros com a equipe foram semanais com leitura do material produzido, reflexões e novas orientações. Alguns encontros aconteceram individualmente para esclarecimentos pontuais, análise do material produzido e organização de apresentação das atividades.

Portanto, a pesquisa-ação realizada buscou indicativos das interlocuções da infância e educação para a construção do PPP e exigiu novos olhares sobre o saber fazer sem a pretensão de esgotar a temática: mais práticas de aprendizagens.

(Re)construção de práticas de mais aprendizagens

As discussões sobre o fazer e saber dos processos de ensino aprendizagem, foram nos últimos tempos estabelecidos pelo distanciamento geográfico da escola, das relações professoras e crianças, em função da disseminação da contaminação letal do vírus do COVID19 que provocou à medida de quarentena compulsória, o fechamento de fronteiras, a desaceleração econômica com incidência nas políticas setoriais compensatórias propostas pelos governos, como forma de lidar com os efeitos financeiros imediatos.

A partir desse impacto estabeleceu uma pandemia pedagógica que impactou o trabalho docente; a concepção de infância, os cenários educativos,  o uso das tecnologias, o que de certa forma resultaram na expressão do medo e, principalmente, no adoecimento do desejo.

Contudo, o saber fazer na educação, em especial para criança, ganha ênfase quando a Escola Municipal Monteiro Lobato resgatou a utopia dos processos de ensinagem[5] e seus desafios que se fizeram presentes em aulas síncronas, em atividades no whatsapp, em encontros virtuais, em cartas via correios, em atividades impressas que tinham como objetivo garantir o direito à educação, Essa nova reorganização didática evidenciou a necessidade de  reelaboração o PPP.

O desenvolvimento das categorias foi assim desenhado pelas equipes:

A equipe   responsável pela revisão do texto base 2018 teve a orientação para reelaborar a escrita de tópicos atuais da educação, bem como fazer leitura de artigos para compreender a dinâmica da produção do PPP. Tem destaque especial para essa ação, sendo a primeira vez que o corpo docente, da Escola Municipal Monteiro Lobato, faz a redação do texto do PPP, desde 2005, em sua inauguração teve uma verba destinada à contratação de assessoria para a condução dessa dinâmica.

No que tange as ações sobre a educação étnico-racial, ainda percebe o diminuto espaço nos percursos curriculares de cursos de formação de professores da Educação, mesmo com a implantação das Leis nº 10.639/03 e nº 11.645/08 e a movimentação da sociedade civil, em especial dos movimentos negros e indígenas.

Educar para a ação e reflexão que coaduna com uma História sensível à Diferença e à Diversidade, permitiu à equipe compreender mais que o domínio de conteúdo, entender as relações sociais, sobre os processos de construção das identidades e os sistemas de reconhecimento recorrentes na sociedade brasileira que discutam a educação étnico-raciais, ou seja, problematizar, expor o racismo, criticar as narrativas tradicionais sobre a nossa formação e reconhecer os diferentes pertencimentos.

Para outra equipe amplia-se a lupa da discussão sobre Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, que exige a construção da equidade no processo de aprendizagem e as estratégias de flexibilização curricular, diferenciação de trajetórias, habilidades e competências, em uma perspectiva multifacetada relacionada à inclusão, combinando atendimentos segregados e integracionistas.

Já em relação ao grupo responsável pelas análises dos perfis utilizou do recurso do Google forms para criar tópicos, comparado a um micro censo da Monteiro Lobato que se tornou relevante para compreender a complexidade da comunidade. A amostragem aleatória simples possibilitou avaliar a construção do comprometimento com o processo educativo escolar das professoras, servidores da PBH, funcionários da MGS, da Caixa Escolar, famílias e crianças.

A equipe responsável pelos estudos PEI/Appia[6], reitera que a educação das infâncias em tempo integral só faz sentido se considerada como um espaço de afirmação de direitos, considerando a criança como participante ativa, sujeitos com corpos recheados de experiências, de essências, de relações, de toque, de trocas, de emoções, sentimentos e de experimentações em relações que marca a vida de quem ensina e de quem aprende concebida como não linear.

Para tanto, hoje pode entender a educação integral, como possibilidade de construir uma educação com qualidade e equidade, compreendida para além do tempo e espaço, caracterizando sua centralidade na ampliação do currículo com a valorização dos saberes, participação de outros sujeitos e a extensão do território educativo articulado com o Projeto Político Pedagógico da escola.

Para as equipes de Legislação vigente de conteúdos e normas de funcionamento Escolar; e Atividades em novos contextos, os estudos basearam-se na BNCC, PNE e outras leis que contemplam um repertório de práticas, de valorização, de promoção para as crianças tornarem-se protagonistas, bem como intensificar o processo de escolarização e a busca de uma pedagogia capaz de respeitar os direitos infantis, considerados sinais assumidos das exigências que a educação de infância reclama sobre si.

No bojo dessas considerações cresce a consciência pública acerca dos direitos da criança à educação ao apontar para a relação dialética que se dá ao estabelecer o contato com o outro. Dessa forma, os direitos atuais são resultantes de inúmeros processos de transformações sociais e subjetivas, os quais apontam para modos de viver e relacionar, visando a um bem coletivo, a uma equidade, presente no PPP.

Considerações finais

Essa leitura sobre a educação em tempos de pandemia estabelece um cenário com novas formas de fazer a educação, em tempo presencial, em Tempus Fugit com discussões que envolvem mudanças teóricas e práticas presenciais. O cenário das discussões dos processos de ensino aprendizagem, a direção e coordenação pedagógica reelaboraram diversos horários, mudanças de espaços, de turnos, acolhida de mais sujeitos na escola-Organizações da Sociedade Civil – reuniões com mediações de conflitos de interesses individuais, para assim, resgatar a proposta do PPP definida e registrada pelas professoras, com o principal objetivo permitir o sucesso da alfabetização das crianças.

Apresentar a construção diária dessa prática, de produzir mais aprendizagem significa constantemente deparar com conflitos de interesses. Isso requer mediar a subjetividade, uma vez que os sujeitos em coautoria tendem a requerer destaque em seus anseios pessoais e veemência em suas histórias de vida. Como em todo processo educativo existe a dicotomia entre o que preconiza a teoria e o que ocorre, na prática, quase que cotidianamente é necessário resgatar os princípios que fundamentam o PPP.

Portanto, o PPP consolida a perspectiva da educação como direito. Isso requer a construção coletiva de uma proposta pedagógica que atenda às exigências atuais de mais aprendizagem, em tempus fugit, e que tenha em vista o desenvolvimento de sujeitos capazes de compreender sua realidade e buscar modificá-la. Enfim, o PPP deve fortalecer as utopias no contexto escolar e favorecer a consolidação de uma escola de aprender, enquanto instituição que congrega, ao mesmo tempo, cultura, diversidade e política.

Referências

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB. 9394/1996. BRASIL.

GANDIN, Danilo. A prática do planejamento participativo: na educação e em outras instituições, grupos e movimentos dos campos cultural, social, político, religioso e governamental. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994

MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2019

SOUZA, José Vieira de; CORRÊA Juliane. Projeto pedagógico: a autonomia construída no cotidiano da escola. apud: DAVIS, Cláudia AL. (Org). Gestão da Escola: desafios a et enfrentar. DP&A, 2014.


[1] As organizações das categorias tiveram como inferência o atual Plano de Gestão da Escola Municipal Monteiro Lobato. Em termos gerais a categorização dos tópicos teve regras sobre os seus limites e definições, de forma que seus processos analíticos obtiveram credibilidade na (re)elaboração do Projeto Político Pedagógico.

[2] A equipe é um grupo de pessoas que realizam algo juntas, sendo que o que foi realizado por elas não é o que as torna uma equipe, mas sim o fato de terem realizado determinada atividade, conjuntamente e ter compromisso com as metas e objetivos propostos (Robbins; Finley, 1997).

[3] BM- Boletim de matrícula que é a identificação do funcionário na Prefeitura de Belo Horizonte. Para exemplificar: Têm professoras que possuem dois cargos na rede municipal de educação, nesse caso dois BM

[4] – A Extensão de Jornada de Trabalho destina-se ao Pessoal do Magistério Público Municipal Estatutário, da Educação Infantil e do Ensino Fundamental, que no contra turno de trabalho amplia sua carga, ou seja, se é lotado pela manhã tem sua extensão de jornada no período da tarde ou vice versa.

[5] O termo ensinagem refere-se a uma prática social, crítica e complexa em educação entre professoras e estudantes, capaz de englobar a ação de ensinar e apreender ao mesmo tempo. Este termo foi cunhado por Léa das Graças Camargo Anastasiou em 1994.

[6] PEI – O Programa Escola Integrada amplia o tempo de atendimento do Ensino Fundamental em espaços de aprendizagens, que tem como proposta atividades diversificadas que contribuem no  desenvolvimento pessoal, social, moral e cultural dos estudantes. O Projeto APPIA: um olhar para a Infância surgiu em 2018 com o objetivo de articular e integrar a Educação Infantil e o Ensino Fundamental, em razão das possibilidades de convívio, em um mesmo espaço físico escolar, de crianças de 3 a 8 anos. 

SANTOS, Cláudia Oliveira. Projeto político pedagógico: (re)construção entre as práticas do trabalho docente. Revista Brasileira de Educação Básica, Belo Horizonte – online, Vol. 7, Número Especial A escola no pós-pandemia, novembro, 2023, ISSN 2526-1126. Disponível em: . Acesso em: XX(dia) XXX(mês). XXXX

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