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Entrevista |

RBEB ENTREVISTA PIBID-UFMG 

No processo de produção da Edição Especial da Revista Brasileira da Educação Básica sobre o PIBID-UFMG Edital CAPES 07/2018, a equipe editorial decidiu realizar entrevistas com diferentes sujeitos que participaram das atividades entre os meses de agosto de 2018 e janeiro de 2020. Tendo em vista que os artigos produzidos pelos núcleos possuem autorias coletivas, esta seção da revista foi pensada como uma maneira de evidenciar trajetórias, experiências e perspectivas pessoais e mais individualizadas; sinalizando vários ângulos pelos quais o PIBID pode (e deve) ser perscrutado. 

Destacamos que a escolha de nossas entrevistadas e nossos entrevistados foi um grande desafio! Após muitos diálogos entre nós e com outros participantes do programa, convidamos cinco pessoas – um licenciando e uma licencianda bolsistas, uma professora supervisora bolsista, uma coordenadora de área bolsista e um gestor escolar –, dentre outros motivos, pelo fato de terem marcado, de uma maneira ou de outra, nossos percursos e de outros colegas no PIBID, seja por seu engajamento, comprometimento, contribuições em atividades coletivas ou seu senso crítico. 

Cada um/a deles/as recebeu, entre dezembro de 2019 e janeiro de 2020, por e-mail, um conjunto de questões elaboradas pela equipe editorial, que foram respondidas prontamente e, agora, estão publicadas neste material. Agradecemos imensamente a disponibilidade e a colaboração. Um afetuoso abraço a cada uma e cada um de vocês! 

Equipe Editorial RBEB Especial PIBID-UFMG Edital CAPES 07/2018

Entrevistado: Gabriel Amorim Braga

Licenciando bolsista do PIBID UFMG Edital 07/2018

Núcleo PIBID: Língua Portuguesa

Formação: Letras – Português/Espanhol

Ano de ingresso na Universidade: 2018/2

Escola em que atuou: Colégio Técnico (COLTEC/UFMG)

Equipe Editorial – Gabriel, conte-nos sobre sua inserção na educação superior, especialmente sua relação com a licenciatura e a profissão docente, e como foi a sua inserção na PIBID.

Gabriel Amorim – “Quando você falava que queria cursar Letras, eu nem sabia o que era isso”. Lembro que foi uma das primeiras coisas que ouvi da minha mãe quando contei da aprovação. Venho de uma família na qual a educação superior sempre foi vista como algo impossível, terminar o ensino médio já era tratado com o ápice. Após alguns meses procurando emprego e sendo “janelado” seguidas vezes, decidi me dedicar a me preparar para o ENEM. Foram meses tentando suprir tudo o que deveria aprender, lidando com a desconfiança e insegurança, familiar e pessoal, mas, no final, tudo deu certo. Mesmo sendo o caçula da família, colecionando algumas dezenas de parentes, fui o primeiro a ter a oportunidade de ingressar no ensino superior, filho de uma faxineira e um pedreiro.

A minha relação com a licenciatura começou ainda na escola. Por ter ingressado na escola antes mesmo dos dois anos de idade, sempre tive esse ambiente como um porto seguro e parte da minha rotina. A escolha pela Letras se deu ainda no ensino fundamental, curiosamente, em virtude da minha dificuldade e do meu “desconhecimento” da Língua Portuguesa. No caminho de tentar aprender mais sobre a língua, acabei me descobrindo entre a gramática e os livros de crônica. Hoje, poemas. Apesar de a Letras ser uma área que sempre admirei, não me via capaz de chegar a essa etapa, tanto que nem sequer cheguei a prestar o ENEM no meu último ano no ensino médio. Contudo, no ano seguinte, fiz e consegui ingressar. Como calouro, as disciplinas, atividades e descobertas só apontavam que estava certo na minha escolha.

Tal como o ingresso no ensino superior, o ingresso no PIBID foi “por um acaso”. Por ainda estar no segundo período, não conhecia bem como era o funcionamento dos projetos de extensão da universidade, mas, por curiosidade, resolvi tentar a vaga. Hoje, vejo que foi uma das minhas melhores escolhas. A oportunidade de driblar a solidão da formação e do percurso docente, com o PIBID, fez com que eu me tornasse um estudante melhor e almejasse ser um profissional melhor. Aprender fazendo, tendo a oportunidade de trocas de experiências, problemas e tudo o que envolve a educação, torna tudo mais “fácil”. 

Equipe Editorial – Qual o papel do PIBID na sua formação inicial como professor? 

Gabriel Amorim – O PIBID, ainda que tenha o seu foco na formação docente, teve, para mim, seu principal papel na área pessoal. Sempre fui muito tímido e, quando respondia a clássica pergunta “O que você quer ser quando você crescer?” dizendo que queria ser professor, era replicado com o “mas tímido assim?”. Experienciar o PIBID fez com que eu percebesse que posso enfrentar esse desafio pessoal para alcançar a minha meta profissional. A primeira aula, para a qual eu já havia reservado altas doses que inseguranças e frio na barriga, surpreendeu-me com a experiência do encantamento de poder estar falando um pouco daquilo que gosto, do que estudo. Até então, estava seguro de estar aprendendo os conteúdos, mas completamente inseguro da minha capacidade de atuar como professor. Não raro, vinha-me à mente a dúvida se seria uma escolha acertada a licenciatura, pela insegurança de enfrentar a sala de aula. O verbo enfrentar, com o apoio da coordenadora, sempre presente, e do supervisor, apaixonado pela área, a cada intervenção foi sendo conjugado. Sinto que valeu a pena e que, durante os longos e breves períodos que me restam na graduação, o PIBID sempre fará parte da minha trajetória, como um dever cumprido.  

Equipe Editorial – Você pode identificar a ideia que você tinha sobre a escola pública – seus espaços, tempos, sujeitos e dinâmicas – ou sobre a educação e que você redimensionou a partir da sua experiência com o PIBID? 

Gabriel Amorim – A percepção de escola pública que tenho ainda é em função da minha experiência como estudante. No PIBID, tive a oportunidade de trabalhar no Colégio Técnico (COLTEC/UFMG), que conta com uma estrutura privilegiada, bem distante da grande maioria das escolas públicas no Brasil, porém possui seus problemas. Dado o contexto do Colégio, os estudantes são submetidos a uma alta pressão, lembrando muito o contexto universitário. Essa realidade, além de fazer com que nos espelhássemos neles, fez com que o subprojeto de Língua Portuguesa escolhesse trabalhar, por um bom período, sequências didáticas que fugissem um pouco desse contexto, propondo aulas mais leves, com teatro e fanfics. A acertada escolha de levar conteúdos diferentes, mais próximos da realidade dos estudantes, fez com que as aulas tivessem grande adesão e engajamento por parte dos estudantes, além de um retorno muito bacana. Isso propiciou aos pibidianos maior liberdade de trabalhar o conteúdo e, ao mesmo tempo, foi quebrando parte da hierarquia professor-estudante.

O que levo da experiência no COLTEC é, em maior medida, a desmitificação de que “trabalhar em escolas com mais recursos é fácil”. Lidar com estudantes, ainda na adolescência, submetidos a tanta pressão fez com que repensássemos esse senso comum, além de enxergar, de fato, a necessidade do professor não como mero repetidor de conteúdo, mas como agente social, com responsabilidades de atuar para o enfrentamento desse contexto. Ao mesmo tempo, pude enxergar a importância de conquistar os estudantes ao longo das aulas e de como isso é relevante, tanto para o ensino-aprendizagem, como também para a relação saudável com a turma.

Equipe Editorial – Quais desafios e possibilidades para a sua formação você pode identificar na sua experiência no PIBID? 

Gabriel Amorim – O maior desafio que identifico, depois da minha experiência no PIBID, é a necessidade do enfrentamento ao apagamento da função social do professor. Ver como muitos dos estudantes encaravam as aulas de Língua Portuguesa como uma válvula de escape, muito pelo seu distanciamento do “padrão” do Colégio, fez com que notassem o nosso papel social e humano. Papel sobre o qual tanto lemos e debatemos, mas só temos, por enquanto, a oportunidade exercê-lo quando atuamos. Durante a atuação, encontramos as demandas, necessidades e realidades. Com isso, passamos a ter pautas reais para os debates e pesquisas, não necessitando de “estudos de caso”. 

O papel do PIBID se sobressai nisso, em poder antecipar a experiência docente. Ignorar a atuação docente durante o período de formação parece ser o principal problema das licenciaturas. A formação, durante quatro, cinco anos fica restrita ao aprendizado de conteúdos e só no final do curso temos um período de atuação, tardio e breve, no estágio. Além de “combater” essa privação da experiência docente, o PIBID também possibilita que os licenciandos possam identificar, durante a atuação, demandas de pesquisas, podendo, a partir delas, retribuir socialmente e profissionalmente o aprendizado.

Equipe Editorial – Há outras considerações que deseje fazer e que não foram abordadas na entrevista, Gabriel? 

Gabriel Amorim – Um ponto pouco comentado da experiência no PIBID é o da motivação e engajamento no curso. Durante o meu período no projeto, estive mais motivado com a Letras por agora me encontrar de fato no curso, por saber que é isso que quero. E isso fez com que eu, mesmo envolvido com o PIBID, tivesse um rendimento maior que nos outros períodos. Aí parece estar o maior mérito do projeto: o seu caráter retroalimentar. A nossa atuação como professores contribui para que os estudantes vivenciem novas didáticas e experiências; ao mesmo tempo, os pibidianos, enquanto estudantes, se mostram mais motivados e engajados com o seu percurso na graduação. Essa motivação não se restringe, entretanto, aos pibidianos. Os supervisores, professores titulares das turmas, se mostravam mais motivados de verem a turma engajada e por se sentirem reconhecidos, por meio da colaboração na formação dos novos professores. 

Além do aspecto formador, vale destacar também como essa experiência contribui para a nossa inserção no contexto profissional. O PIBID contribui para que os pibidianos possam formar o seu currículo e, não raro, acabam tendo a oportunidade de vivenciar experiências fora do projeto. Foi comum ouvir relatos de participantes tendo oportunidade de ingressar em estágio, atuarem em outras escolas, dentre outros, em virtude da experiência e do peso do PIBID, fato que também ocorreu comigo. Na graduação, tive a oportunidade de ingressar na Iniciação Científica, também na área da Educação, muito em virtude do diferencial da participação no PIBID.

Entrevistada: Júlia Teresa Vieira Leite

Licencianda bolsista do PIBID UFMG Edital 07/2018

Núcleo PIBID: História 

Formação: História

Ano de ingresso na Universidade: 2016

Escola/s em que atuou no PIBID:  Escola Estadual Professor Antônio José Ribeiro Filho, Escola Municipal Milton Campos e Escola Estadual Professor Affonso Neves

Equipe Editorial – Júlia, conte-nos sobre sua inserção na educação superior, especialmente sua relação com o curso de licenciatura e a profissão docente, e como foi a sua inserção no PIBID.

Júlia Teresa – Estudei durante toda a educação básica em escolas do setor privado, sendo que nos dez últimos anos, até eu me formar no ensino médio, estudei no Colégio Espanhol Santa Maria Cidade Nova. Na época, era pouco comum que os alunos optassem por cursos de licenciatura. Uma observação que fiz a posteriori é que, no colégio onde estudei, nos perguntávamos e nos era perguntado “onde” cursaríamos o ensino superior, e não “se” o faríamos. Fazer um curso superior já estava em nosso horizonte de expectativas, estava naturalizado. Porém, não era assim nas escolas por onde passei, tanto no PIBID quanto nos estágios obrigatórios. Poder traçar esse tipo de comparação foi fundamental para minha formação como educadora, porque é uma questão importante a se pensar sobre o sistema educacional no Brasil. 

Primeiramente, eu decidi que seria professora, só depois decidi que cursaria História. Quando eu decidi que faria História e que seria professora de História, a maioria das pessoas próximas a mim ficou surpresa e grande parte delas tentou me convencer de escolher outro curso, inclusive alguns dos professores. Boa parte de minha família também não gostou da ideia, porque achavam que era um “desperdício” eu fazer um curso para me tornar professora. 

Durante quase todo o ensino fundamental e, também, durante o ensino médio, eu tinha o hábito de estudar com minhas e meus colegas para as provas de praticamente todas as disciplinas. Eu realmente gostava de fazer isso, e os estudos costumavam ser divertidos. Eu adorava ver a satisfação das pessoas ao perceberem que tinham entendido a matéria, que não era tão difícil como elas pensavam, ao sentirem que eram capazes de entender. E era lindo de ver quando o progresso e o aprendizado apareciam na melhoria das notas. Hoje eu penso que fui, aos pouquinhos, dia a dia, me tornando professora e me apaixonando pela constante troca que é o processo de ensino-aprendizagem, pelo crescimento mútuo. 

Quando decidi que me formaria para ensinar História, meu maior receio era não conseguir dar uma aula. Não por nervosismo ou algo do tipo, mas porque me passaram a ideia de que, para ser professora, eu teria que ser séria, brava e gritar, e que não poderia sorrir muito. Também não faltaram pessoas para me amedrontar dizendo que eu iria apanhar dos alunos em sala de aula, e que nunca seria respeitada por ser “boazinha”. Hoje percebo que é necessário que se estabeleça a relação pedagógica e que as alunas e os alunos reconheçam em mim uma figura de autoridade. Entretanto, hoje entendo que há outros meios de ter autoridade, por outras vias que não os gritos. 

 Escolher um curso de licenciatura me leva a pensar constantemente a Educação, incluindo formas diferentes de conceber o ensino. O papel do professor vai muito além do ensino de informações técnicas. O educador tem papel central na constituição dos seres humanos que estão sendo formados ali. É na escola que são desenvolvidas habilidades que serão mobilizadas para toda a vida, não só no mercado de trabalho, mas também no exercício da cidadania e na vida em sociedade. É uma missão muito importante fazer parte, mesmo que minimamente, do desenvolvimento das meninas e meninos, homens e mulheres que passam pela sala de aula, e é também uma possibilidade de aprender, de rever meus conceitos e posicionamentos e de também estar em constante formação e reconstrução por meio das trocas diárias.

Recentemente, reencontrei uma colega, e ela me disse que decidiu cursar Biologia por minha causa. Isso porque uma vez, no segundo ano do ensino médio, estudei com ela para a prova de recuperação em Biologia. Ela me disse que não gostava e que tinha muita dificuldade, mas que passou a gostar depois dos nossos estudos. Lembro-me de que ela tirou quase nota máxima na prova. Saber disso me emocionou muito, porque eu nunca imaginaria uma coisa dessas. Foi a primeira vez que eu entendi e que eu vi que uma aula minha poderia influenciar no caminho de alguém.

A primeira vez que ouvi falar do PIBID foi em uma aula de Psicologia da Educação. Eu estava no segundo período da faculdade. A professora explicou como funcionava. Fiquei encantada, mas não achava que teria capacidade para entrar no programa. Não havia entendido muito bem que era justamente para quem estava iniciando o curso, e não cheguei a pesquisar mais a respeito nem a conversar com ela sobre o assunto. Alguns períodos depois, conversei com alguns colegas que estavam participando e todos eram apaixonados pelo programa. 

Em 2018 saíram os editais tanto para o PIBID como para o Residência Pedagógica, que tinham objetivos de melhorar a formação de professores. Minha ideia inicial era me inscrever para o segundo, já que eu já tinha concluído o quinto período da faculdade (embora com menos de 50% do curso concluído quando a seleção foi realizada), e o PIBID tinha como público alvo as pessoas que estavam iniciando a licenciatura e haviam tido nenhum ou pouco contato com a docência. Entretanto, acabei me inscrevendo e passando para o PIBID, e não me arrependo de maneira alguma dessa escolha. Participar do programa me possibilitou conhecer muitas realidades e amadurecer muito como pessoa, mas também me tornar uma educadora mais experiente, ainda que em formação. Aliás, a tarefa de educar exige estar em estado de constante formação. Mesmo se eu pudesse voltar atrás, escolheria ser pibidiana novamente. 

Equipe Editorial – Qual o papel do PIBID na sua formação inicial como professora, Júlia? 

Júlia Teresa – Como eu já tinha passado da metade do curso quando entrei para o PIBID, eu já havia tido contato com sala de aula como estagiária por meio do estágio obrigatório. Porém, a experiência do PIBID foi maravilhosa e extremamente diferente. Eu também não era muito mais experiente que meus outros colegas pibidianos, mas tinha uma visão um pouco maior do curso de História, e acredito que a possibilidade de comparar as diversas experiências me acrescentou muito. 

Apesar de o curso de História na UFMG exigir cinco estágios obrigatórios, as abordagens e o formato eram muito diferentes entre si, e ainda mais diferentes do PIBID. A despeito de também haver problemas e conflitos, como tudo na vida, eu sentia nas reuniões de área que havia um ambiente saudável de discussões e um espaço aberto para dividir as vivências e compartilhar angústias e dúvidas que permeiam a vida docente. 

Compartilhar essas experiências e ouvir diferentes pontos de vista sobre uma mesma questão era incrível, tanto para nós, pibidianas e pibidianos, como para os professores supervisores. Aprendi que, às vezes, a docência é uma atividade solitária, mas aprendi também, no PIBID, que não precisa ser assim, e que as coisas ficam mais fáceis e mais leves quando compartilhadas. 

Estar no PIBID também me permitiu estabelecer um contato mais profundo com o cotidiano escolar e com os próprios professores, de forma direta e constante, não só os supervisores, mas também professores de outras disciplinas, bem como outros funcionários da escola. Isso nos ofereceu a possibilidade de desenvolver projetos na escola, tanto dentro da disciplina História como projetos mais amplos, de forma que pudemos ir além da observação da sala de aula, como ocorre nos estágios comuns, além de termos criado laços mais profundos com os alunos e com os professores que acompanhamos. 

Uma das contribuições mais importantes que o PIBID proporcionou à minha formação ao acompanhar mais intensamente o cotidiano escolar foi perceber o quão humanos são os professores. Pude analisar como pessoas diferentes entre si tentam resolver as questões que aparecem na sala de aula e na escola e perceber que, às vezes, uma estratégia ou uma abordagem podem dar muito certo, mas às vezes não, já que são tentativas e possibilidades. Aprendi que, às vezes, as coisas falham, os professores erram, têm dúvidas, incertezas e que não sabem de muitas coisas também. 

Também aprendi, no PIBID, a olhar para a escola sob uma perspectiva mais profunda, diferente e mais ampla que a sala de aula de História. Fomos levados a observar como a arquitetura escolar, por exemplo, impacta no funcionamento da escola e, também, das aulas, o que pude perceber na prática. Fomos convidadas e convidados a olhar para os sujeitos que compõem o ambiente escolar e a observar como a escola reflete questões que não são apenas dela, mas questões que dizem respeito à sociedade de forma geral. 

Como parte do meio social mais amplo, o espaço escolar também está permeado por relações de poder.  Inevitavelmente, como sujeitos que passamos a integrar a vida escolar, nós também pudemos não só perceber, mas sentir as tensões do que Michel Foucault chamou de teia de poder. Essas disputas se dão no interior da própria escola, entre os sujeitos que dela participam, mas também com outras instituições. É possível perceber, por exemplo, diferenças nas relações estabelecidas entre as escolas e a polícia e a Guarda Municipal, bem como com os outros poderes locais e com a própria comunidade onde está inserida. É importante tentar perceber e entender essas dinâmicas, porque isso pode dizer muito sobre o funcionamento da escola. 

Entretanto, para além de aguçar nosso olhar para conseguirmos ver e entender mais sobre o dia a dia escolar e sobre a carreira docente, um dos pontos mais relevantes para minha formação no PIBID foi o fato de que éramos protagonistas de forma mais evidente do que nas outras experiências que tive. Foi-nos dado um espaço para especular, tentar, errar, acertar, propor estratégias e discussões, vivenciar profundamente as coisas, falar o que pensávamos e, muitas vezes, conduzir o rumo não só das reuniões, mas do Núcleo como um todo. 

Ter esse espaço ativo foi uma das melhores coisas que eu poderia ter vivenciado na minha formação docente, e sinto que adquiri muita experiência e aprendi muito. Acredito que permitiu uma aproximação maior com a realidade de ser uma professora, porque dar aula exige tomar muitas decisões, escolher caminhos, traçar estratégias, acertar e errar. Da mesma forma, passamos a encarar a sala de aula de forma mais natural e éramos sempre incentivados a dar aulas, fazer participações, preparar materiais e, muitas vezes, improvisar. Fomos levados a pensar estratégias, abordagens e novas formas de despertar o interesse dos estudantes, bem como maneiras de ancorar o conhecimento na vivência deles, para que as aulas fizessem mais sentido e fossem mais interessantes. Como consequência, nos familiarizamos melhor com a sala de aula e com o fazer docente. Por fim, o PIBID me ensinou que eu consigo, sim, dar aula e foi o PIBID que fez com que eu me apaixonasse ainda mais pela Educação, especialmente pelo ensino público.

Equipe Editorial – Júlia, você pode identificar uma ideia que você tinha sobre a escola pública – seus espaços, tempos, sujeitos e dinâmicas – ou sobre a educação e que você redimensionou a partir da sua experiência com o PIBID? 

Júlia Teresa – Participando do dia a dia das escolas por meio do PIBID, pude desconstruir uma série de preconceitos e noções erradas do imaginário disseminado na sociedade acerca do que é e do funcionamento (ou não funcionamento) do ensino público no Brasil. A primeira delas é que não existe um modelo de “a escola pública”, mas sim uma diversidade enorme de escolas, com funcionamentos e dinâmicas internas muito diferentes entre si, variando de acordo com múltiplos fatores. Além disso, pude perceber que, ao contrário do que por vezes se diz, o ensino público funciona, e em muitos aspectos é melhor do que as escolas particulares onde estudei. Existem, sim, muitos problemas e desafios, mas existe muita coisa boa, muitos bons professores e profissionais. Entretanto, o que mais me encantou positivamente foram os alunos e as alunas, pois o estereótipo criado acerca delas e deles é absolutamente injusto. Eles não são ruins como se escuta falar. Aliás, assim como não existe “a escola pública”, não existe “o aluno de escola pública”. São sujeitos muito diferentes entre si, cheios de potencialidades e capazes de fazer coisas incríveis. 

Equipe Editorial – Quais desafios e possibilidades para a sua formação você pode identificar na sua experiência no PIBID? 

Júlia Teresa – Acredito que um dos meus maiores desafios será instaurar a relação pedagógica de forma que as alunas e os alunos me vejam como figura de autoridade. Pude perceber que, às vezes, é difícil traçar quais são os limites de aproximação e intimidade que eu poderia estabelecer especialmente com as alunas e os alunos, para não ser vista apenas como amiga deles. O fato de eu aparentar ser mais jovem do que sou também colabora para essa dificuldade. 

Também percebi que preciso trabalhar minha projeção vocal e cuidar da garganta. Ao mesmo tempo, apesar da preocupação de não dar conta, as experiências do PIBID me tranquilizaram com relação a muitas coisas. Eu tinha muito medo de não conseguir sistematizar o conteúdo e sempre achei que sabia pouco, e sofria com isso. Entretanto, hoje percebo que os melhores professores com quem tive contato na vida não foram os que sabiam mais informações, mas os que faziam as coisas com mais atenção, carinho, cuidado e dedicação. Concluí que, de uma forma ou de outra, sou capaz de preparar o conteúdo, e reparei que vou melhorando a cada aula, que nem sempre as coisas sairão como planejei, mas que isso é absolutamente normal. Foi no PIBID que eu senti, pela primeira vez, que já sou professora, e a sensação é maravilhosa. Apesar dos desafios e questões, no PIBID eu tive a confirmação de que escolhi a profissão certa e que eu amo a área da Educação. 

Equipe Editorial – Para finalizar, Júlia, você tem outras considerações que deseje fazer e que não foram abordadas na entrevista?

Júlia Teresa – O PIBID foi fundamental para minha formação como professora e meu amadurecimento. Pensar a Educação é tarefa fundamental e constante de quem se pretende professor, mas às vezes isso não acontece. Realizar essas reflexões em grupo, podendo compartilhar pontos de vista e experiências é muito produtivo, e o programa permitiu que professores universitários (coordenadores), convidados, professores da educação básica (supervisores) e estudantes de licenciatura em formação se reunissem para pensar juntos questões relacionadas ao ensino, e os resultados para cada um, assim como para as escolas, foram espetaculares. 

Acredito que as escolas parceiras também ganharam muito ao nos receber, como pibidianas e pibidianos. Além dos diversos projetos desenvolvidos nas escolas, a chegada de jovens universitários no espaço escolar mexeu com as relações ali antes estabelecidas e estabeleceu um novo equilíbrio. Percebo que tanto os professores supervisores como os próprios estudantes se animaram com nossa chegada. Acredito que as aulas ficaram mais interessantes e dinâmicas e que as pessoas, em alguma medida, ficaram mais motivadas. Também vejo como produtivo o contato de professores com experiência em sala de aula com graduandos e graduandas, que não têm experiência ainda, mas estão tendo contato com estudos recentes da Academia, o que não deixa de ser uma forma de compartilhar saberes. O PIBID é um projeto que extrapola os muros da universidade e que coloca em contato o conhecimento acadêmico e o conhecimento escolar, cumpre a função social imprescindível de estabelecer a ponte entre a educação básica e a educação superior. 

Por fim, gostaria de ressaltar o quanto é importante que os integrantes do projeto recebam a bolsa para participar. É evidente que melhorar a Educação no Brasil, especialmente a educação básica pública, não é prioridade. Ao contrário, a Educação e seus profissionais recebem constantes ataques. Em meio a um cenário desfavorável, o fato de os participantes do projeto, tanto os supervisores como os coordenadores e os pibidianos recebermos para, juntas e juntos, pensarmos formas de melhorar a Educação e para nos formarmos enquanto professoras e professores é extremamente simbólico e importante. 

Entrevistada: Jeanne Mary Vieira Chequer

Supervisora bolsista do PIBID UFMG Edital 07/2018

Núcleo PIBID: Pedagogia EJA (Educação de Jovens e Adultos)

Formação: Pedagogia – UFMG

Anos de profissão: 23 anos de magistério no ensino fundamental da rede pública de Belo Horizonte e Contagem.

Escola em que atuou pelo PIBID: Escola Municipal Maria de Magalhães Pinto

Equipe Editorial – Jeanne, conte-nos sobre sua inserção na educação básica, especialmente sua relação com a profissão docente, e como foi a sua inserção na PIBID.

Jeanne Mary – Meu primeiro cargo como professora foi em 1998 através de concurso público para atuar em escolas estaduais. Àquela época, ainda não possuía o diploma de Pedagoga, apenas o curso de Magistério. Ingressar na UFMG foi um divisor de águas na minha carreira profissional. A Pedagogia me abriu horizontes, ampliou a capacidade reflexiva de analisar o sentido da prática pedagógica, do currículo, da avaliação e do sentido da docência. Foi um salto em qualidade! Após formada, fiz novo concurso para a Prefeitura de Belo Horizonte, onde mantenho meu cargo atual trabalhando com séries iniciais e Educação de Jovens e Adultos (EJA), turma pela qual me inscrevi para participar do PIBID. A escolha da turma da EJA se deu pela grande identificação com essa modalidade de ensino com a qual vinha trabalhando há mais de dez anos e o desejo de retornar à universidade num diálogo de práticas. Quando me inscrevi, imaginei que seria uma excelente oportunidade de aprimoramento profissional, mas confesso que ultrapassou minhas expectativas!

Equipe Editorial – O que representou a entrada do PIBID na sua sala de aula e na escola em que trabalha?

Jeanne Mary – O PIBID EJA aconteceu em uma turma Educação de Jovens e Adultos com funcionamento externo à escola, localizada no Centro de Apoio Comunitário (CAC) Serrano, no período da tarde. Para a entrada do PIBID na turma, anteriormente foi feita uma conversa com os educandos explicando um pouco sobre o programa e como seria a rotina, realizada pelos bolsistas em duplas de trabalho ao longo da semana. Resolvemos fazer uma recepção de boas-vindas para os pibidianos com a presença da direção da escola, que ofereceu um kit com diversos itens escolares e lanche coletivo. Creio ser essa descrição das boas-vindas o retrato do acolhimento e da reciprocidade estabelecidos entre a turma e os pibidianos ao longo do período de vigência do programa. Observei que as relações se estabeleceram de maneira respeitosa e afetuosa, que os educandos da EJA reconheceram nos pibidianos profissionais em formação que foram apoio pedagógico no processo de ensino e mais, que em muitos momentos recorreram a eles para buscar aquela “ajudinha” mais individualizada para tirar dúvidas ou socorrer nas atividades. Houve também disposição dos pibidianos em atender as demandas dos educandos, inclusive, adequando-se à grande diversidade no perfil da turma, principalmente o geracional, que compreende educandos de 16 a 82 anos. Dessa forma, ao final do último semestre do programa, a avaliação coletiva dos educandos sobre o processo do PIBID na EJA CAC Serrano foi muito positiva, com falas como: “não deveria acabar”, “sentiremos muita falta do PIBID aqui”, “teve uma aula sobre os quilombos urbanos que eles deram que eu nunca vou esquecer”, “queria agradecer a paciência, o carinho e o respeito que eles tiveram com a gente”, “eu gostava quando dividia a turma e a gente ia estudar lá na sombra do gramado”, “acho que eu até aprendia melhor.” 

Por ser uma turma de jovens, adultos e idosos, creio que a avaliação dos próprios educandos demonstra a legitimidade do impacto positivo do período que o PIBID esteve conosco na turma. Já na escola a visibilidade do programa foi menor, por tratar-se de turma externa. Contudo, apresentei, na escola, o pôster produzido para o seminário e os demais trabalhos nas Feiras Culturais, para garantir que o PIBID fosse divulgado para a comunidade escolar. Além disso, os educandos também fizeram essa divulgação espontânea do PIBID, tanto nas apresentações de trabalhos, ao agradecerem o apoio dos pibidianos na preparação, quanto em casa, comentando com as famílias, que também deram retorno positivo ao relatarem o orgulho da proximidade com a UFMG.

Equipe Editorial – Como você vê o seu trabalho no PIBID como formadora de professores?

Jeanne Mary – Como educadora da Educação de Jovens e Adultos, receber os graduandos da Pedagogia em nossa turma me faz refletir diariamente sobre meu compromisso com uma prática emancipatória, popular e crítica. Nesse sentido, a lógica do termo “formadora” no PIBID torna-se invertida, pois ali estou para ser observada e buscar oferecer o melhor que estiver ao meu alcance. Poderia dizer, sim, que estou (re)formando minha prática. E isso de me reformar, reformular, de me rever, tem se constituído como um importante momento de reflexão e crítica. Dessa forma, prefiro dizer que venho me constituindo parte integrante do PIBID de muitas maneiras. Me constituir “formadora” do PIBID tem sido sinônimo de muitos desafios e aprendizagem, sobretudo na lógica de uma prática pedagógica solidária, em que tenho em mente atender as necessidades educacionais dos educandos da EJA e o diálogo teórico-prático com os colegas pibidianos. Ali, em sala, puderam perceber a intencionalidade por trás do planejamento ao se trabalhar determinado método, conteúdo, tema ou projeto, e isso é muito rico na formação profissional. Também, para mim, foi rico retornar à literatura para embasar o planejamento e a prática. Além disso, trabalhar sob a coordenação de Analise da Silva foi um grande conforto e diferencial nos momentos de dúvida e insegurança, fazendo com que a trajetória do PIBID-EJA transcorresse sempre numa organização coletiva, dialogada, transparente e reflexiva dos processos. 

Equipe Editorial – Como o PIBID contribuiu para a sua formação continuada? 

Jeanne Mary – Ser admitida no PIBID e retornar à universidade foi, reitero, um divisor de águas na minha formação. Não é que eu não refletisse sobre a minha prática, isso sempre fiz. Mas quando estamos no meio acadêmico, estamos em contato com tantas questões! São conversas formais e informais, palestras, seminários, textos, uma profusão de acontecimentos, leituras e conteúdos que, até por osmose, passam a revirar o que antes estava quieto. Ter como coordenadora Analise da Silva, uma grande referência em Educação de Jovens e Adultos, que em sua orientação nos apresentou diversas atividades diversificadas em EJA – diga-se de passagem, que em anos de magistério não tive – já foi um novo diploma! Considero que o PIBID me proporcionou uma formação em serviço em EJA consistente, crítica e atuante, em tempo real, em sala de aula. Espero, sinceramente, ter também contribuído na formação docente dos pibidianos, na contrapartida do grande aprendizado que tive.

Equipe Editorial – O que você diria para os futuros professores que, em breve, poderão estar trabalhando com você na educação básica? 

Jeanne Mary – Que nossa profissão requer de nós muita consciência de nosso papel social. Que devemos ter o compromisso de compreender a educação como direito inalienável das pessoas em qualquer fase da vida. Que, como profissionais da Educação pública, precisamos defendê-la de forma gratuita, laica, democrática e popular, de qualidade social e que se contraponha a todas as formas de preconceito. Que é necessário nos formar e atualizar sempre, e que um ótimo companheiro de carreira e cabeceira é Paulo Freire.

Equipe Editorial – Há outras considerações, Jeanne, que deseje fazer e que não foram abordadas na entrevista?

Jeanne Mary – Gostaria de destacar o papel da coordenação institucional para o bom andamento do programa. Foi muito importante a socialização das diversas atividades produzidas pelas diferentes áreas nos seminários que aconteceram ao final de cada semestre. A oportunidade das reuniões por área também enriqueceu e qualificou a troca de experiências entre os supervisores. O planejamento dessas atividades certamente foi um diferencial que oportunizou ampliar a experiência do PIBID-UFMG.

Também não posso deixar de destacar a importância do PIBID e do Residência Pedagógica (RP) como ferramentas educacionais na qualidade da formação acadêmica de professores. Ter a oportunidade de acompanhar a sintonia do processo de planejamento e prática pedagógica de um professor da escola pública e o processo de aprendizagem dos estudantes da educação básica ainda na graduação, sob a coordenação de um professor da universidade, fazendo um diálogo aberto entre teoria e prática é muito enriquecedor! Defendemos a manutenção e expansão do PIBID e do Residência Pedagógica como investimento federal público na melhoria da formação de professores.

Entrevistada: Roberta Guimarães Corrêa

Coordenadora de Área do PIBID UFMG Edital 07/2018

Núcleo PIBID: Química

Formação: Licenciada em Química, Mestre em Química e Doutora em Ciências pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar.

Anos de profissão: oito anos atuando como docente na Educação Superior presencial, com experiências no ensino técnico de nível médio e, também, na Educação a Distância. Dezesseis anos estudando e pesquisando na área Educação em Ciências. 

Instituição em que trabalha: Departamento de Química do Instituto de Ciências Exatas – DQ/ICEx, da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG

Equipe Editorial – Roberta, conte-nos qual a sua inserção na educação superior, especialmente na formação inicial e continuada de professores, e como foi a sua inserção no PIBID.

Roberta Corrêa – A minha inserção na educação superior aconteceu logo após o término da minha graduação. Ansiosa por começar a trabalhar, queria dar aulas, queria exercer a profissão. Então, em 2007 começava uma nova fase da minha vida, fazia mestrado na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), em São Carlos/SP, e trabalhava como docente substituta na Universidade Estadual Paulista (UNESP) do campus de Presidente Prudente/SP. Eu percorria mais de 430km por semana, rodoviárias, ônibus, passagens faziam parte da minha vida. Eu me lembro até hoje do nervosismo que senti na minha primeira aula. A turma ia iniciar os estágios supervisionados na escola e cursar a primeira disciplina focada nas questões do ensino da Química. 

Tanto os estágios supervisionados como a disciplina de instrumentação para o ensino de Química I estavam sob minha responsabilidade. Eu tinha acabado de me formar e ainda estava processando, refletindo, digerindo toda a formação teórica e buscava, nas minhas poucas experiências práticas, articular e trazer algumas contribuições para aquela turma. Eu me sentia constantemente confrontada a mostrar a relevância da profissão docente, explicitar a complexidade do processo de ensino e de aprendizagem, alertar sobre a dimensão política da profissão. Mas eu não me sentia capaz e, desde essas primeiras experiências, passei a me questionar sobre o papel da formação inicial e, também, sobre o impacto que as disciplinas e os professores formadores causam nos licenciandos. Esse começo me marcou muito. Foi meu choque de realidade, assim como foi e tem sido muito importante para minha trajetória profissional. Julgo que as aulas que dei nessa época não foram as melhores. 

Minha capacidade de argumentação não era a melhor, mas me marcaram profundamente. Desde 2007, muita coisa aconteceu na minha profissão: novas turmas, novas disciplinas, novas instituições. Nessa trajetória, tive a primeira oportunidade de trabalhar no PIBID. Foi em 2011, enquanto fazia doutorado na UFSCar, que acompanhei o trabalho da coordenação do Núcleo da Química e o trabalho dos licenciandos em uma escola pública estadual da Cidade de São Carlos. Pude acompanhar de perto a ida dos licenciandos às escolas, o trabalho desenvolvido e as inquietações dos pibidianos. Esse primeiro contato com o PIBID foi completamente diferente do que vivenciei no edital de 2018, não só pelo fato de estar vinculada a outra instituição de ensino superior, a UFMG, mas também por atuar como coordenadora do Núcleo da Química e por trabalhar com um número significativamente maior de pibidianos e professoras supervisoras. 

Agora, refletindo um pouco sobre o que foi o PIBID para mim, percebo que o que vivenciei junto às professoras supervisoras e aos pibidianos me possibilitou preencher algumas das minhas lacunas e responder a alguns dos questionamentos sobre o papel da formação inicial na formação de professores. Longe de ser um programa perfeito, ainda mais por sua suscetibilidade às políticas de governo, que acabam trazendo sérias consequências ao nosso trabalho enquanto formadores, o PIBID tem construído pontes entre as universidades e as escolas de educação básica e, por meio dessas pontes, estamos promovendo discussões, buscando alternativas e construindo vínculos fundamentais para melhoria da formação inicial nas licenciaturas.

Equipe Editorial – Como coordenadora do PIBID, você pôde trabalhar com professores no processo de formação inicial e continuada. O que foi possível identificar quanto a diferenças e semelhanças em relação às demandas desses diferentes grupos de professores?

Roberta Corrêa – Por ter sido coordenadora do núcleo da Química, pude acompanhar um pouco das relações que foram se constituindo entre pibidianos e supervisoras, assim como pontos de convergência e divergência entre esses grupos. Durante os dezoito meses de PIBID, sempre tivemos em mente o desejo de promover melhorias no ensino da Química. Queríamos que os estudantes das escolas aprendessem e gostassem mais da Química. Para todo o grupo, foi uma árdua tarefa semanal pensar, planejar, realizar e refletir sobre as diferentes ações realizadas. Isso nos unia, mas ao mesmo tempo nos mostrava como nosso grupo era diverso, pois eram perceptíveis as diferentes formas de pensar o processo de ensino e de aprendizagem, os estudantes da escola, a ação das supervisoras, a ação dos bolsistas, o papel da escola na formação dos adolescentes, entre outros. Só que o mais interessante, para mim, foi perceber que essa diversidade não era somente perceptível entre supervisoras e licenciandos, entre os próprios licenciandos pude perceber diferenças. Talvez isso tenha ficado evidente pela quantidade elevada de pibidianos, uma vez que nosso núcleo era composto de 25 graduandos. 

Em alguns momentos conseguíamos estabelecer consensos, mas, em outros, havia divergências que interferiam de alguma forma no andamento dos trabalhos. Considerando o grupo de pibidianos e o grupo das supervisoras, foi interessante observar que os licenciandos se mostraram muito mais sensíveis e inquietos em relação aos estudantes das escolas, a ponto de isso ter sido muito discutido entre eles e toda a equipe. Talvez sensibilizados por todo o trabalho de Cartografia escolar feito por todo o PIBID no segundo semestre de 2018, uma vez que foi uma demanda da Coordenação Institucional do PIBID-UFMG, questões de interesse dos pibidianos estavam relacionadas a como os estudantes do ensino médio se relacionavam com a escola, com os demais colegas, professores, direção e expectativas quanto ao futuro. Por outro lado, o interesse em melhorar os processos de ensino, em propor atividades diferentes foi uma demanda constante das supervisoras. Demandas diferentes que foram importantes para que nossa equipe pudesse trabalhar, de forma diversificada, as diferentes dimensões da docência. 

Equipe Editorial – O que você acha que experiências como a do PIBID têm a ensinar e a desensinar para o campo da formação de professores (disciplinas dos cursos de licenciatura, estágios, relação entre universidade e escolas da educação básica, políticas públicas etc)?

Roberta Corrêa – O PIBID tem muito a ensinar no campo de formação de professores, porque ele promove a aproximação, a articulação e o trabalho colaborativo entre as universidades e as escolas da educação básica. É a aproximação do principal campo de atuação profissional do professor com os centros de formação, e isso é muito importante para que os cursos de formação inicial e continuada possam trazer contribuições para o exercício da profissão. Além disso, tal aproximação e articulação nos dá a possibilidade de conhecer e valorizar o que é realizado pelos professores na educação básica. Existe muito conhecimento sendo produzido nas salas de aula pelos professores. Como mencionei anteriormente, vejo o programa como uma ponte onde as relações e conhecimentos de diferentes sujeitos devem ser valorizados. Contudo, o PIBID precisa efetivamente compor a política de formação de professores, não pode ser uma iniciativa que pode ou não acontecer, não pode privilegiar uma ou outra área do conhecimento. Tem que ser institucionalizado, deve ser valorizado e reconhecido por todas as licenciaturas. É um programa que vai muito além da concessão de bolsas, ele é muito mais importante que isso. Quando comecei a participar do PIBID, em 2011, o programa ainda encontrava-se em seu início e muitos não sabiam o que ele era. Hoje, nove anos depois, ainda vejo esse desconhecimento dentro das universidades.

Equipe Editorial – Para finalizar, Roberta, quais desafios e possibilidades você visualiza, hoje, nas relações entre a educação básica e a educação superior?  

Roberta Corrêa – Quando olho para o que foi construído pela equipe da Química ao longo dos dezoito meses de trabalho, vejo que um dos grandes desafios é manter ativas e fortes as relações que construímos e as ações realizadas. Enquanto um projeto, que tem começo, meio e fim, sei que existe um tempo determinado para nossa atuação. Mas fico me perguntando como nossa atuação pode ser mais duradoura, como manter as pontes que construímos ativas e fortes. Além disso, temos tantas outras escolas, professores, licenciandos, instituições de ensino superior… Precisamos ampliar o nosso trabalho, não o contrário. Acredito que sem o trabalho conjunto entre a educação básica e a educação superior pouco vamos avançar nos programas de formação inicial e continuada. 

Entrevistado: Wagner Diógenes de Souza

Gestor da Escola Estadual Professor Affonso Neves no período de vigência do PIBID UFMG Edital 07/2018

Formação: Licenciatura em Física (UFMG), Especialização em Design Instrucional para EaD Virtual (UNIFEI)

Anos de profissão: 14 anos

Equipe Editorial – Wagner, o que representou a entrada do PIBID na escola?

Wagner Diógenes – Nossa escola tem buscado uma transformação para a melhoria da Educação. Primeiramente, buscamos reformar toda a parte estrutural (rede física) de nossa escola com implementação de várias possibilidades pedagógicas. Além da reforma predial, foi implantada, na escola, a sala de multimeios, o laboratório de informática, Wifi liberado para alunos, sistema de som com a Rádio Escola, biblioteca escolar funcional, horta com plantas medicinais, jardinagem com flores e frutas… Buscamos, também, uma inserção na tecnologia por meio de um site (https://professoraffonsoneves.escola.mg.gov.br/), do nosso canal no Youtube e de nossa Fanpage, além da utilização de outras ferramentas.

Com o ambiente aconchegante e favorável ao aprendizado, precisávamos ter uma atenção mais voltada para um aprimoramento pedagógico em nossa escola e é nesse sentido que o PIBID veio nos auxiliar. Ele nos trouxe um olhar externo, pois estamos tão habituados em nossas rotinas que muitas vezes não observamos novas possibilidades na maneira como o aprendizado acontece. Com a análise e sugestões do PIBID, foi possível refletir sobre nossa maneira de trabalhar a Educação e propormos ações de melhoria da qualidade educativa de nossa escola. Ou seja, o PIBID é parte fundamental na reforma/melhoria pedagógica de nossa escola.

A professora Mariete Amaral, supervisora do PIBID de História, nos relatou que: “Na escola Professor Affonso Neves, o PIBID aproximou ainda mais a escola e a UFMG, proporcionando aos docentes envolvidos um contato com novas teorias da academia; novos autores e novas práticas pedagógicas. O PIBID também ofereceu aos docentes cursos de atualização e trocas de experiências. Penso que o PIBID deveria se integrar à estrutura curricular dos cursos de licenciatura, pois ele é o mínimo que um curso de formação de professores deve oferecer, uma vez que auxilia na formação, mostrando que a pesquisa e a formação continuada devem ser praticadas desde a formação inicial.”

Equipe Editorial – Quais possibilidades e desafios da formação inicial e continuada de professores você vislumbrou com o PIBID na escola? 

Wagner Diógenes – Os limites de possibilidades somos nós mesmos que impomos. A relação dos alunos de licenciatura com a escola gera, a cada dia, novas possibilidades, pois a cada dia aprendemos algo diferente que é possível adaptar a qualquer ambiente. A recíproca é verdadeira, pois os Pibidianos (forma carinhosa com a qual chamamos os alunos/bolsistas do PIBID) também têm muito a aprender com os profissionais de nossa escola.

Um dos maiores desafios é buscar sempre a nossa melhoria e a “zona de conforto” é um perigo, pois nos deixa acomodados. Ao pensarmos que já somos bons o suficiente, deixamos de acreditar que precisamos nos renovar e, assim, fica difícil de acontecer uma formação continuada. Ao entendermos que sempre teremos algo novo a aprender e que sempre podemos ser melhores no que fazemos, estaremos em eterna formação.

Algo a que devemos ficar atentos é a relação entre os alunos de licenciatura e o professor da escola, que atua como supervisor. Precisamos vigiar nossos pensamentos. O pibidiano deve tomar cuidado ao pensar que o professor está desatualizado e que o método dele já não serve mais e que somente ele, aluno da licenciatura, está certo com as novas ideias. Já o professor corre o risco de pensar que os pibidianos não têm vivência em sala de aula e, por isso, não têm utilidade. Toda experiência e toda ideia devem ser valorizadas e esse intercâmbio é primordial para dar vida à Educação e fomentar o aprendizado.

Equipe Editorial – Quais desafios e possibilidades você visualiza, hoje, nas parcerias entre a educação básica e a educação superior na formação de professores?  

Wagner Diógenes – No campo das possibilidades, acredito que não haja limite, pois estamos sempre abertos a qualquer sugestão, implementação de projetos e novas parcerias. Sonhamos que um dia possamos ter uma escola que trabalhe efetivamente com uma proposta pedagógica com ênfase na teoria das múltiplas inteligências, proporcionando, a cada indivíduo, um bem-estar indizível. Para isso contamos e sempre contaremos com a UFMG como nossa parceira. Temos a grande vantagem de sermos a escola mais próxima, geograficamente, da Faculdade de Educação, e pouco a pouco estamos aproximando os nossos corações, confirmando o que foi dito sobre as possibilidades.

Temos que observar um desafio em toda relação, seja ela entre as pessoas ou entre instituições, que é o respeito mútuo às características pessoais de cada um. Ao aceitarmos o outro ou a outra instituição da forma que ela é e agirmos da forma que achamos que deve ser correto, poderemos ser exemplo para o outro e, assim, despertarmos no outro a vontade de mudança e não impormos a nossa vontade ao outro. Ao aceitarmos essa condição, as relações de confiança aumentam e passamos a ter mais segurança no que estamos propondo, além de evitar desgastes gerados pelo melindre.

Mariete Amaral também nos disse: “Muitas são as críticas no sentido de que a universidade desconhece o cotidiano da escola e esta, por sua vez, desconhece as discussões do âmbito acadêmico. O PIBID favorece essa aproximação. Na escola, os universitários têm a oportunidade da vivência de diferentes situações no processo de ensino e aprendizagem. Em contrapartida, a escola tem contato com metodologias inovadoras e textos acadêmicos atualizados, que potencializam a busca por melhor qualidade educativa.”  

Equipe Editorial – Há outras considerações, Wagner, que deseje fazer e que não foram abordadas na entrevista?

Wagner Diógenes – O sentimento que temos é de gratidão a todos que estão relacionados ao PIBID-UFMG pela grande oportunidade de aprendizado. Afirmamos que vocês fazem a diferença em nossa escola, principalmente em relação aos alunos, pois são eles os mais beneficiados com a presença de vocês. Quantas vezes eu vi os pibidianos prestando atendimento aos alunos! Essa atenção dispensada aos nossos alunos tem transformado e salvado vidas.

Esperamos que sempre se sintam realmente como parte integrante de nossa escola, sendo tratados como um professor deve ser tratado e, caso isso não esteja acontecendo, por gentileza nos avisem para que possamos mudar a nossa postura. Afinal de contas #TamosJuntos em prol da Educação.

Finalizo apresentando algumas palavras da professora supervisora Mariete Amaral: 

“Como professora supervisora do PIBID de História, percebi que os licenciados que fazem parte do PIBID têm uma melhor desenvoltura nos estágios, lidam com mais facilidade com as turmas e com as propostas de sequências didáticas.[…] O PIBID, ao ter entre seus objetivos ‘inserir os licenciados no cotidiano de escolas da rede pública de educação […]’ possibilita a aproximação com a realidade da profissão.”

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