IPPOG-Masterclasses em escola pública estadual do Rio de Janeiro: a percepção dos alunos participantes
Adriana Oliveira Bernardes
Doutoranda em Ensino de Física do PEMAT (UFRJ). Possui graduação em Licenciatura em Fìsica pela Universidade Federal de Juiz de Fora (1998) e mestrado em Ciências Naturais, modalidade Ensino de Ciências, pela Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (2009). Atualmente é professora docente da Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro e tutora presencial do Consórcio das Universidades do Estado do Rio de Janeiro (CEDERJ) de Introdução as Ciências Físicas II, Introdução à Informática e Cálculo I. Tem experiência na área de Física, com ênfase Ensino de Física, atuando principalmente nos seguintes temas: Ensino de Astronomia, Divulgação de Astronomia, Física Inclusiva e Novas Tecnologias na Educação.
E-mail: fisica.adrianabernardes@gmail.com
Márcia Begalli
Possui graduação em Bacharelado (1979) e em Licenciatura (1980) em Física pela Universidade Estadual de Campinas, mestrado em Física pelo Instituto de Física Teórica (1982) e doutorado em Física pela Rheinisch-Westfalischen Technischen Hochschule – Aachen (1989), Alemanha. Atualmente é professor associado da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Trabalha com Fisica de Altas Energias, participando atualmente do experimento Dzero, no Fermilab e do experimento ATLAS, no LHC, CERN. Realiza o Masterclass-Hands on Particle Physics, em colaboração com o IPPOG e com outros organizadores brasileiros, sendo a responsável nacional em conjunto com Prof. Dr. Vitor Oguri.
E-mail: marciabegalli@gmail.com
INTRODUÇÃO
Este artigo apresenta uma pesquisa realizada com alunos de um colégio público estadual que participaram do evento IPPOG-Masterclasses. A pesquisa teve o objetivo de realizar uma sondagem sobre a percepção desses alunos com relação ao evento, à inserção de temas atuais ao currículo escolar, bem como sobre o uso de novas tecnologias em sala de aula.
Um dos problemas vivenciados, hoje em dia, pelo professor em sala de aula é a falta de interesse dos alunos que, na maioria das vezes, não vê sentido no que está aprendendo, tampouco na relação direta com os fenômenos que ocorrem em seu dia a dia.
Em relação ao interesse de estudantes por ciências, Neves e Talim (2012) relatam que
O interesse de estudantes em estudar temas curriculares de ciências pode ser diferenciado para meninos e meninas e que a idade e uma das necessidades psicológicas básicas, a competência, podem ser considerados como fatores subjacentes explicativos para o interesse e o desinteresse, como demonstrado pelos estudantes (NEVES; TALIM, 2012, p. 1).
Tais resultados mostram que o interesse dos alunos depende de vários fatores, entre outros: o gênero e a idade. Para o professor, portanto, é importante compreender a percepção do aluno sobre o processo de aprendizagem para que construa em seu fazer pedagógico uma maneira de chegar até o aluno e despertar seu interesse.
A pesquisa foi realizada com 25 alunos de ambos os sexos de uma escola pública, que cursavam o 3a. série do Ensino Médio. Esses alunos participaram do evento no qual foram oferecidas três atividades: palestra sobre o “Grande Colisor de Hádrons” – LHC –, oficina na sala de informática para acesso aos dados do acelerador de partículas e discussão dos dados obtidos.
A mídia tem divulgado ao longo dos anos variadas informações sobre o LHC, o acelerador de partículas do Centro Europeu de Energia Nuclear – CERN –, que, hoje, é o maior do mundo. Sobre suas descobertas de partículas e do bóson de Higgs, várias informações chegam aos alunos e acabam despertando seu interesse. Tal fato oferece a oportunidade de abordar esse tópico de ensino em sala de aula por meio de atividades que simulem regularidades e possibilitem aos alunos não só a aprendizagem de conceitos relacionados à Física, mas que também os introduza em práticas e vivências científicas.
Desse modo, a percepção dos alunos em relação a essa abordagem da introdução da Física de Partículas e de recursos inovadores em seu processo de ensino e aprendizagem torna-se importante recurso para a aprendizagem significativa dos conteúdos. Nesse sentido, as pesquisas realizadas sobre o acelerador de partículas do CERN podem colaborar para que os estudantes entendam a importância dessa linha da ciência na atualidade.
DELIMITANDO CONCEITOS E FERRAMENTAS
Tratamos aqui de conceituar e delimitar algumas questões que se mostram preponderantes para compreensão das atividades desenvolvidas com os alunos, assim como suas potencialidades e limitações. Dessa maneira, cremos que a abordagem que propomos com este artigo poderia torna-se mais viável aos nossos pares que, porventura, quisessem fazer uso das contribuições e possíveis diretrizes aqui relacionadas.
O ENSINO DE FÍSICA DE PARTÍCULAS E O IPPOG – MASTERCLASSES
Com o intuito de divulgar suas descobertas, o próprio CERN vem desenvolvendo, desde 2005, o evento intitulado “IPPOG-Masterclasses-Hands on Particle Physics”, direcionado a professores e alunos do Ensino Médio, contemplando também alunos de graduação em Física e áreas afins. Esse evento é realizado em âmbito mundial e foi criado para a comemoração do Ano Internacional da Física – 2005.
O Brasil começou a participar do projeto em 2008, com o evento realizado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ – e pelo SPRACE – Universidade do Estado de São Paulo – UNESP. Ao longo dos anos, o evento estendeu-se para outras instituições, sendo, hoje, realizado também pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de Lavras (UFLA), Universidade Federal do Ceará (IFCE) e Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
Vários autores abordam a importância da introdução da Física Moderna no Ensino Médio, e alguns apresentam experiências bem-sucedidas, tais como: Ostermann e Cavalcanti (1999), Caruso e Freitas (2009), Kikuchi e Ortiz (2013), e Luz e Wiga (2013). É desejável que a Física Moderna faça parte dos currículos, motivando o aluno ao aprendizado e apresentando a ciência feita na atualidade, tratando de descobertas recentes pelas quais a ciência procura respostas qualificadas via pesquisas.
Nesse contexto, Bernardes e Reis (2014) discutem e defendem a introdução de tópicos de Física Moderna no currículo de Física das escolas estaduais do Rio de Janeiro, como as Forças Fundamentais da Natureza, a Teoria da Relatividade Restrita e Geral e a Evolução Estelar. Esse é o tópico que trataremos na próxima seção.
O Ensino de Física de Partículas e o Currículo Mínimo Estadual de Física
O currículo estadual do Rio de Janeiro foi reformulado em 2012, trazendo novos conteúdos e sugerindo novas abordagens. Ele foi elaborado visando o trabalho focado nas habilidades e competências como sugerido nos Parâmetros Curriculares Nacionais, com foco nas “Ciências da Natureza, Matemática e suas tecnologias”.[1]
Parte dos conteúdos mencionados na seção anterior já constam do currículo mínimo estadual de Física, para o estado do Rio de Janeiro. As habilidades e as competências que constam dos currículos não escapam dos PCN+, lançados há alguns anos, que trazem orientações educacionais complementares aos PCN, em vigor desde 1998. Essas orientações deixam abertas as possibilidades de se trabalhar os temas. Por exemplo, a temática em que se insere o trabalho que foi realizado com os alunos do ensino médio da escola pública, aqui reportado, faz parte do Tema 5 dos PCN+, Matéria e radiação. Especificamente trata da habilidade de “Acompanhar o desenvolvimento tecnológico contemporâneo” (BRASIL. PCN+, 2006, p. 77). Esse desenvolvimento poderia se dar em várias áreas.
Contudo, o Currículo Mínimo para o estado do Rio de Janeiro, de certo modo, fragmentou o tema abordado pelos PCN+, nas 1a e 2a séries. Na 1a série, entre as habilidades e competências, encontram-se: “Reconhecer o modelo das quatro forças fundamentais da natureza” e “Identificar a relação entre massa e energia”; na 2a série: “Analisar, argumentar e posicionar-se criticamente em relação a temas de ciência, tecnologia e sociedade”. Pode-se observar que os tópicos são genéricos e têm relação direta com o Tema 5 – Matéria e radição – dos PCN+.
Segundo o texto de introdução desse tema:
O cotidiano contemporâneo depende, cada vez mais intensamente, de tecnologias baseadas na utilização de radiações e nos avanços na área da microtecnologia. Introduzir esses assuntos no ensino médio significa promover nos jovens competências para, por exemplo, ter condições de avaliar riscos e benefícios que decorrem da utilização de diferentes radiações, compreender os recursos de diagnóstico médico (radiografias, tomografias etc.), acompanhar a discussão sobre os problemas relacionados à utilização da energia nuclear ou compreender a importância dos novos materiais e processos utilizados para o desenvolvimento da informática (BRASIL. PCN+, 2006, p. 77)
Nesse contexto, a importância da Física Moderna no Ensino Médio, com temas atuais, é uma tentativa de tornar a o conhecimento mais significativo para os alunos. O foco não pode mais ser “o quê ensinar”, mas “por que ensinar”, como rezam as diretrizes. Assim,
A explicação para a maioria dos fenômenos pesquisados na atualidade é alvo de estudo do que chamamos Física Moderna e Contemporânea; podem ser explorados conteúdos de: Teoria da Relatividade Restrita e Geral, Mecânica Quântica e buracos negros, entre outros. Alguns desses conteúdos já foram inseridos no Ensino Médio e no currículo mínimo estadual do Rio de Janeiro onde constam, habilidades e competências a serem desenvolvidas envolvendo esses temas (BERNARDES (2019, [s.p])
O fato de tais conteúdos serem alvos de discussão da mídia, presentes em jornais, revistas e internet, favorece o interesse do aluno, que veria nisso algo de significativo, que merecesse aprofundamento.
Desse modo, o IPPOG-Masterclasses consiste em explicar aos interessados a Física de Altas Energias, de forma introdutória, levando-os a analisar eventos reais registrados pelos experimentos do LHC, no CERN. Normalmente, os eventos do IPPOG-Masterclasses são constituídos, segundo BEGALLI et al. (2015), de palestras introdutórias sobre o modelo padrão da física de partículas elementares, sobre detectores e métodos de detecção de partículas, discussões, utilização de internet, análise de eventos e discussão dos resultados.
2.3 O CERN
O Centro Europeu de Pesquisas Nucleares (em francês, Organisation Européenne pour la Recherche Nucléaire) – CERN –, criado 1954 e localizado em Genebra, na fronteira da França com a Suíça, é o maior laboratório de física de partículas do mundo atualmente. O CERN possui um complexo de aceleradores que fornecem feixes de partículas tanto para a pesquisa básica quanto para a pesquisa aplicada. O mais recente desses aceleradores é o Large Hadron Collider (LHC).
Além dos experimentos de Física de Altas Energias, o CERN desenvolve equipamentos e tecnologias que são utilizados em diversas áreas do conhecimento científico, tais como a invenção da Internet (World Wide Web), o desenvolvimento de detectores altamente segmentados para a visualização de imagens em medicina, de equipamentos de radioterapia, de tecnologias de computação em nuvem, entre outros.
O LHC – O QUE É E COMO FUNCIONA
O LHC foi construído em um túnel de 27 km de circunferência, a 100 metros abaixo da superfície, situado nos arredores de Genebra, na fronteira da França com a Suíça. O túnel foi originalmente construído para abrigar o acelerador LEP. O LHC colide feixes de prótons com energia no centro de massa equivalente a 13 TeV e possui a taxa de colisões por unidade de área (denominada Luminosidade instantânea), L = 1034 cm−2s−1, bem como feixes de íons pesados (Pb) com energia de 2.76 TeV por nucleon e uma luminosidade de L = 1027 cm−2s−1.
Feixes de prótons ou íons pesados são colididos em quatro pontos de interação onde os principais experimentos estão localizados. São eles: ALICE [5], desenvolvido para estudar a física dos íons pesados, ATLAS [6] e CMS [7] que são detectores de propósito geral, ou seja, estudam toda a física envolvida nas colisões próton-próton e o LHCb [8], especializado na física do quark b.
Como o LHC colide partículas com a mesma carga elétrica, próton-próton, dois diferentes anéis são necessários dentro do túnel para que os feixes de prótons circulem em direções opostas. Os prótons passam por diversos pré-aceleradores e são agrupados em pacotes (bunches). Com um espaço nominal por pacote de 25 ns, aproximadamente 2808 pacotes de prótons são necessários para preencher o LHC. Cada pacote possui em torno de 1.011 prótons. Dipolos e quadrupolos magnéticos utilizam supercondutividade para gerar campos magnéticos que excedem 8 Tesla, operando em temperaturas abaixo de 2 Kelvin. São eles os responsáveis por manter os feixes na órbita circular do acelerador. Cavidades de radiofrequência são usadas no processo de aceleração [9].
A fonte dos prótons é um simples recipiente com gás hidrogênio onde os elétrons são retirados dos átomos de hidrogênio, utilizando um campo magnético, assim os prótons restantes do átomo são levados para o acelerador linear (LINAC2) de forma a aumentar sua energia para 50 MeV antes de injetá-los no Próton Synchroton Booster (PSB), atingindo 1.4 GeV de energia. Posteriormente os prótons são introduzidos no Próton Synchroton (PS) onde são acelerados a 25 GeV e em seguida no Super Próton Synchroton (SPS) que finalmente injeta os pacotes de prótons no LHC com uma energia de 450 GeV e lá são novamente acelerados até a energia necessária para a colisão. [10]
O MODELO PADRÃO
O modelo matemático que melhor descreve o comportamento das partículas elementares e suas interações é conhecido como Modelo Padrão das Partículas Elementares, ou simplesmente Modelo Padrão. Costumamos usar a representação esquemática, mostrada na Figura 1, para elencar as partículas elementares que compõem o Modelo Padrão, com as 3 “famílias” de quarks e léptons, os bósons intermediários.
Figura 1 – Representação esquemática do Modelo Padrão, com as 3 “famílias” de quarks e léptons, os bósons intermediários e o bóson de Higgs
Fonte: New Science
Os Léptons (leve, em grego) não têm estrutura interna (são pontuais). O elétron é o mais conhecido deles, e é estável. O múon e tau decaem, ambos têm o mesmo comportamento do elétron quando interagem segundo as quatro forças fundamentais, apesar de serem bem mais massivos, o múon tem 200 vezes a massa do elétron, o tau, 3600 vezes.
Os Quarks compõem os hádrons, tais como o próton e o nêutron. Não são observados isoladamente nos experimentos, sabemos de sua existência indiretamente, estudando os hádrons produzidos nas interações dos feixes de colisão. Os quarks têm carga elétrica fracionária quando formam os hádrons sua combinação é tal que a soma das cargas seja sempre um número inteiro. Os hádrons são subdivididos em mésons (compostos por um par quark-antiquark) e em bárions (compostos por 3 quarks). Entre os hádrons, somente o próton é estável.
Os Bósons Intermediários são os mediadores das interações entre as partículas. Os fótons são registrados no detector. W e Z0 decaem, W no par da mesma “família”, Z0 no par partícula-antipartícula. Os glúons “ligam” os quarks dentro dos hádrons e, tais como os quarks, não são observados isoladamente.
A primeira “família” forma a matéria tal como a conhecemos. O próton é formado por 2 quarks u e 1 quark d (carga elétrica total 2/3 + 2/3 – 1/3 = 1). O nêutron é formado por 2 quarks d e 1 quark u (carga elétrica total 2/3 – 1/3 – 1/3 = 0). Prótons e nêutrons formam o núcleo atômico. Os elétrons orbitam o núcleo, formando assim os átomos. O neutrino do elétron, também da primeira “família” é observado no decaimento radioativo beta, quando um nêutron decai em próton + elétron + anti-neutrino do elétron, mudando o elemento químico, visto que o número atômico (Z) é acrescido de 1. As outras duas “famílias” são observadas somente nas interações de altas energias. As partículas compostas por esses quarks decaem e estudamos sua produção, decaimentos, modos de interação, através de seus produtos de decaimento. Esse é o caso, por exemplo, da J/ψ, um méson formado pelo par de quarks charm e anti-charm, das partículas estranhas, contendo pelo menos um quark s (estranho), ou mesmo do méson D0, formado por um quark charm e um quark anti-u.
As antipartículas são geradas nas colisões próton-próton do LHC, ou em decaimentos das partículas produzidas nessas interações. Elas são idênticas às partículas, a única diferença é que apresentam cargas de sinais contrários em relação às suas respectivas partículas.
As quatro forças fundamentais, responsáveis por todas as interações que observamos na natureza são:
- Força Forte – mantém a coesão nuclear, exemplos: fusão nuclear, bombas termonucleares;
- Força Fraca – responsável pelo decaimento radioativo, exemplos: fissão nuclear, reatores nucleares geradores de energia;
- Força Eletromagnética – responsável pela interação entre partículas eletricamente carregadas e pela interação com campos magnéticos, mantém a coesão atômica, exemplos: reações químicas, fenômenos elétricos, fenômenos magnéticos; e
- Força Gravitacional – responsável por nos manter na superfície da Terra, pelo movimento dos corpos celestes, pelas órbitas dos planetas em torno do Sol, da Lua em torno da Terra, entre tantos outros exemplos.
O Bóson de Higgs é o gerador do campo de Higgs. As partículas adquirem massa porque interagem com o campo de Higgs. Em julho de 2012, os experimentos ATLAS e CMS anunciam a descoberta de uma partícula compatível com o bóson de Higgs. Desde então, a análise contínua de diversos canais de decaimento do Higgs, mostraram que essa partícula é o bóson de Higgs. Até o momento, todos os resultados mostram que ele é totalmente compatível com as previsões do Modelo Padrão.
O EXPERIMENTO ATLAS
Normalmente, cada instituição escolhe um experimento cujos dados irá analisar no Masterclass. Escolhemos o ATLAS, um dos quatro maiores experimentos do LHC, o Grande Colisor de Hádrons, no CERN, na fronteira franco-suíça. É um experimento de propósito geral, tal como o experimento CMS. Isso significa que esses dois experimentos estudam todos os tópicos da Física acessíveis às energias de colisão disponibilizadas pelo LHC, 7 TeV, 8 TeV, 13 TeV e 14 TeV. São estudados os produtos das colisões próton-próton com essas energias de centro de massa. O experimento ALICE foi construído para estudar colisões de íons pesados, por isso, o LHC também fornece feixes de íons de chumbo, então, os experimentos ATLAS e CMS também analisam essas colisões.
É comum utilizarmos o elétron-Volt como unidade de energia, ou seja, a energia que um elétron ganha quando é acelerado por um potencial elétrico de 1 Volt. Tera elétron-Volt, ou TeV, significa 1012 eV (trilhão de eV). Levando em conta a equação de Einstein, E=mc2, usamos eV e seus múltiplos para designar também a massa das partículas.
O ATLAS tem 46 m de comprimento, 25 m de altura, peso de 7.000 toneladas e possui cerca de 100 milhões de canais de eletrônica para registrar os produtos das colisões próton-próton. Várias partículas são geradas nessas colisões, elas irão atravessar os diversos detectores que formam o experimento, montados de forma concêntrica, que exploram as diferentes características das partículas subatômicas a fim de obter o máximo possível de informação a respeito dessas colisões e seus produtos, aliado à maior precisão acessível no mundo. A forma cilíndrica, com duas tampas, também instrumentalizadas com vários detectores, permite envolver toda a região da colisão, evitando perdas de informação. As grandes dimensões do experimento garantem que todas as partículas produzidas depositarão ali toda a sua energia, terão suas trajetórias, momento e energia reconstruídos com precisão. E a proteção de radiação estará garantida, porque nenhuma radiação escapa do detector.
Essa estrutura é dividida em partes:
Detectores de Traços
- Detectam partículas com carga eléctrica.
- Medem as suas posições em função do tempo.
- Estão envolvidos por um campo magnético homogêneo => as trajetórias são deflectidas pela ação deste campo.
- A reconstrução da curvatura da trajetória permite calcular o momento linear da partícula e determinar a sua carga eléctrica.
- A interação entre as partículas produzidas na colisão e o material dos detectores de traços é muito pequena, assim as partículas depositam nestes detectores pouquíssima energia.
Calorímetro Eletromagnético
- Onde são detectadas as partículas e antipartículas que interagem com a matéria maioritariamente através da interação eletromagnética => fótons, elétrons e pósitrons.
- Praticamente toda a energia destas partículas e anti-partículas é absorvida pelo calorímetro eletromagnético e transformada num sinal eletrônico.
- A intensidade do sinal é uma medida da energia da partícula, que é totalmente absorvida no detector.
Calorímetro Hadrônico
- Onde são detectadas as partículas que interagem maioritariamente através da interação forte, como as partículas constituídas por quarks e/ou antiquarks, por exemplo os prótons e nêutrons.
- Praticamente toda a energia destas partículas e antipartículas é absorvida pelo calorímetro hadrônico e transformada num sinal eletrônico. (similar ao EM)
- A intensidade do sinal é uma medida da energia da partícula, que é totalmente absorvida no detector (similar ao EM).
Câmara de Múons
Múons depositam uma pequena fração da sua energia nos calorímetros, são as únicas partículas que atravessam todas as camadas do Detector ATLAS.
estão colocados na camada exterior de ATLAS.
- Estão envolvidas num campo magnético adicional Toroidal
- São constituídas por milhares de longos tubos cheios de gás, com um fio longitudinal no centro de cada tubo.
- Quando um múon passa através do tubo, ioniza o gás libertando elétrons, criando íons positivos, que se deslocam para o fio e para a parede do tubo devido a uma grande diferença de potencial elétrico entre o tubo e o fio, criando assim um sinal elétrico mensurável.
METODOLOGIA
O evento IPPOG-Masterclasses foi realizado no Colégio Estadual Canadá localizado em Nova Friburgo no estado do Rio de Janeiro. O colégio conta com aproximadamente 600 alunos matriculados nos turnos matutino, vespertino e noturno.
O trabalho foi realizado com a turma de 3o ano do Ensino Médio no turno matutino, contando com a participação de aproximadamente 25 alunos matriculados. A turma faz parte do PROEMI (Programa de Ensino Médio Inovador), instituído pelo governo estadual, que requer a formação do aluno em tempo integral. Todos os participantes são alunos da Profa. Adriana Oliveira Bernardes, na disciplina de Física, e, sob a orientação dela, participam de atividades extraclasses em Física e Astronomia.
A metodologia de pesquisa empregada foi à pesquisa-ação. Segundo Trip (2005):
A pesquisa-ação educacional é principalmente uma estratégia para o desenvolvimento de professores e pesquisadores de modo que eles possam utilizar suas pesquisas para aprimorar seu ensino e, em decorrência, o aprendizado de seus alunos […] (p. 3)
No contexto, acreditamos que a pesquisa traga benefícios aos alunos no sentido de contribuir para seu interesse e formação, bem como para o professor que poderá refletir sobre seu trabalho em sala de aula e melhorar sua prática pedagógica.
Para o professor atuante, segundo Trip (2005):
É importante que se reconheça a pesquisa-ação como um dos inúmeros tipos de investigação-ação, que é um termo genérico para qualquer processo que siga um ciclo no qual se aprimora a prática pela oscilação sistemática entre agir no campo da prática e investigar a respeito dela (p. 4).
Nesse sentido, esse modo de pesquisa “(…) requer ação tanto nas áreas da prática quanto da pesquisa, de modo que, em maior ou menor medida, terá características tanto da prática rotineira quanto da pesquisa científica (TRIP, 2005, p. 5).
O evento IPPOG-Masteclasses foi dividido em três etapas: inicialmente foi realizada palestra, abrangendo o tema Física de Partículas Elementares e os experimentos do LHC. Logo depois, com o acesso a computadores, foram observados eventos do experimento ATLAS. Posteriormente, as percepções sobre a observação e a exploração do conteúdo foram discutidas com os alunos em modo de seminário.
Para obter a visão dos alunos participantes da atividade extraclasse IPPOG-Masterclasses foi aplicado um questionário estruturado com questões fechadas. Apesar do evento já ter sido realizado na escola anteriormente, apenas dessa vez, sondamos a visão dos alunos sobre a sua relevância.
A ideia de se usar um questionário estruturado teve como base a facilidade de tabulação e análise dos dados que seriam obtidos. Um questionário pode ser definido como:
[…] uma técnica de investigação composta por um número mais ou menos elevado de questões apresentadas por escrito às pessoas, tendo por objetivo o conhecimento de opiniões, crenças, sentimentos, interesses, expectativas, situações vivenciadas etc. (Gil,1999, p. 128).
Moysés e Moori (2007, p. 2) observam que “[o]s questionários geralmente são utilizados para a obtenção de grandes quantidades de dados, geralmente para análises qualitativas”. O modelo de questionário utilizado para a obtenção dos dados pode ser visto no Anexo A. O questionário utilizado (Cf. ANEXO A) era composto de sete questões e as respostas variavam no gradiente de Ruim, Regular, Bom e Ótimo. O intuito de usar esse gradiente foi o de verificar, de modo mais eficaz, o que pretendíamos saber sobre as opiniões dos participantes.
A análise dos dados obtidos com o questionário levou em consideração tanto a quantificação quanto a qualificação das respostas. Esse procedimento foi feito em função dos nossos objetivos com a pesquisa-ação, por um lado:
Os resultados da pesquisa quantitativa podem ser quantificados. Como as amostras geralmente são grandes e consideradas representativas da população, os resultados são tomados como se constituíssem um retrato real de toda a população alvo da pesquisa. A pesquisa quantitativa se centra na objetividade (GEHARDT; SILVEIRA, 2009 , apud FONSECA, 2002, p. 20).
A característica principal da quantificação baseou-se na “objetividade” que buscamos. E, por outro lado, em relação à pesquisa qualitativa, segundo (GEHARDT; SILVEIRA, 2009, p. 3): “A pesquisa qualitativa não se preocupa com representatividade numérica, mas, sim, com o aprofundamento da compreensão de um grupo social, de uma organização, etc.”
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Consideraremos essa avaliação para as próximas etapas do projeto implantado no Colégio Estadual Canadá, de Nova Friburgo, localizado no estado do Rio de Janeiro, e acreditamos que uma avaliação qualitativa mais abrangente, obtida por meio de depoimentos de alunos também será bem-vinda nos próximos eventos.
De um modo geral, as respostas dos alunos as perguntas direcionam para oferecer um ensino contextualizado ligado aos avanços tecnológicos da sociedade e utilizando-se de novas tecnologias.
Sabemos da importância de promover na escola o aprendizado de forma diferenciada dos mesmos modelos de aulas expositivas, fazendo com que os alunos, ao longo do tempo, passem por variadas experiências de aprendizagem.
O desenvolvimento deste trabalho deu-se com a utilização do computador como ferramenta de aprendizagem, num contexto de aula expositiva dialogada. Sabemos da importância de se conhecer a percepção dos alunos do processo de aprendizagem utilizado, uma vez que uma visão positiva sobre os conteúdos e sobre a forma de se aplicar esse conteúdo poderia motivá-los.
O método de aula expositiva dialogada, segundo Anastasiou e Alves (2004):
[…] é uma exposição de conteúdo, com a participação ativa dos estudantes, cujo conhecimento prévio deve ser considerado e pode ser tomado como ponto de partida. O professor leva os estudantes a questionarem, interpretarem e discutirem o objetivo de estudo, a partir do reconhecimento e do confronto com a realidade (ANASTASIOU; ALVES, 2004, p. 79).
No caso deste trabalho, os alunos foram incentivados a participar, realizando perguntas e comentários em todos as etapas desde as palestras até a exploração do conteúdo via internet.
Em relação aos recursos utilizados, foi marcante a tecnologia do computador ligado à internet para pesquisas na área da disciplina de Física; isso colabora bastante com o trabalho do professor em sala de aula.
Feltrim (2015) ressalta a análise criteriosa que o professor tem de fazer quanto ao uso das “novas tecnologias” na escola:
Os educadores não devem desconsiderar que a tecnologia é inerente aos alunos, assim, o computador é encarado como uma nova maneira de representar o conhecimento, provocando um redimensionamento dos conceitos já conhecidos e possibilitando a busca e compreensão de novas ideias e valores. Usá-lo com essa finalidade requer a análise cuidadosa do que significa ensinar e aprender, bem como demanda rever o papel do professor nesse contexto. Não se pode utilizar as Novas Tecnologias como uma simples oportunidade para passar informações, mas deve-se propiciar a vivência de uma experiência que contextualiza o conhecimento que ele constrói (FELTRIN, 2015, p. 2).
O que mais um professor atualmente poderia querer, além da ampliação do espaço da sua sala de aula para instigar os alunos? Isso não é uma tarefa fácil, uma vez que a maioria deles já faz uso da internet para diversas atividades. O autor abaixo ressalta ainda que
As Novas Tecnologias ampliaram as possibilidades de materiais didáticos, beneficiando, em particular, a disciplina de Física. Os seus diversos modos de utilização como a aquisição de dados, simulação, acesso à internet, construção de experimentos e visualização de vídeos permitem a diversificação de estratégias no ensino (FELTRIN, 2015, p. 4).
O que chama a atenção quanto às observações de Feltrim (2015) são as possibilidades de diversificação de estratégias para que se coloque ênfase na relação de ensino e aprendizagem no ambiente escolar.
Os dados obtidos por meio do questionário estruturado sobre as visões dos alunos do evento são apresentados a seguir.
Item 1 – “Para participar do Masterclass, você inicialmente assistiu a uma palestra sobre Física de Partículas. Classifique o seu entendimento sobre os temas abordados.”
Verificamos que a maioria dos alunos, 67%, qualifica a palestra que precede o evento como “bom” e “ótimo”. No entanto, nossa tarefa mais contundente nesse episódio seria entender o porquê de mais de 25% dos participantes terem considerado a tarefa de abertura somente como “regular”, e quase 10%, “ruim”.
Gráfico 1 – Questionário – Item 1
Fonte: Adriana Oliveira Bernardes, 2019.
Para o item 2 – “Como você qualifica as informações passadas antes do início da análise dos eventos do LHC?”
Verificamos que 89% consideraram “bom” e “ótimo”. Somente 11% classificaram essa etapa como “ruim”.
Gráfico 2 – Questionário – item 2
Fonte: Adriana Oliveira Bernardes, 2019.
Esse item foi importante para nos fazer perceber que somente 11% dos participantes, após a primeira etapa da atividade, tiveram uma percepção ruim. Os resultados mostram que a etapa introdutória cumpriu o papel de aguçar a participação dos alunos.
Item 3 – “Qual o grau de sua compreensão da atividade realizada?”
Verificamos que 90% responderam que tiveram compreensão “boa” e “ótima”.
Gráfico 3 – Questionário – Item 3
Fonte: Adriana Oliveira Bernardes, 2019.
Apesar de a percepção dos alunos ser bastante positiva, a persistência, até este ponto, dos aproximadamente 10% que marcaram “ruim” é um caso a ser apurado.
Item 4 – “De que modo ter participado do Masterclass motiva seu envolvimento com questões científicas?”
As respostas apontaram que 52% dos alunos avaliam como “bom” e “ótimo” o evento como fator para favorecer seu envolvimento com questões científicas.
Gráfico 4 – Questionário – Item 4
Fonte: Adriana Oliveira Bernardes, 2019.
Apesar de os números apresentarem positividade, o volume de respostas ruins dos outros itens para este subiu mais de 50%; de uma média de 10%, foi para 16%.
Item 5 – “Como você considera o tempo dedicado à palestra?”
As respostas apontaram que 50% dos participantes consideram o tempo de duração da palestra sobre o tema da atividade como “bom” ou “ótimo”.
Gráfico 5 – Questionário – Item 5
Fonte: Adriana Oliveira Bernardes, 2019.
O volume de respostas “ruim” caiu em 20%, na média das respostas aos outros itens. Vemos isso de forma positiva, mas ainda assim, o valor está próximo dos 10% que persistem. As respostas para “regular” chamaram mais a atenção, 42% dos participantes é um valor bem expressivo, nesse caso.
Item 6 – “O tempo dedicado à discussão das observações feitas foi.”
Os dados apontaram que 77% consideram “bom” e “ótimo”.
Gráfico 6 – Questionário – Item 6
Fonte: Adriana Oliveira Bernardes, 2019.
O fator de ênfase para o Item 6 é o fato de não haver respostas negativas. O item de regular, de certo modo, é normal para casos com esse.
A avaliação do trabalho, de modo geral, mostra percentuais favoráveis para todos os itens. O item 4 também merece uma atenção especial, porque envolve questões até mesmo relacionadas com o futuro dos alunos, pois trata-se do incentivo ao conhecimento científico, Esse item teve um valor para “regular” mais alto do que para ótimo, talvez por ainda não ser factível para os alunos adentrar nesse universo da pesquisa científica, em função da complexidade que o tema abrange. E foi também nesse item que o valor para respostas negativas foi mais alto, o que denota um certo desinteresse por parte dos 16% que responderam “ruim”. No geral, os valores são positivos.
As Fotografias 1 e 2 mostram alunos envolvidos com a Mostra de Física de Partículas do Colégio Estadual Canadá de Nova Friburgo.
Fotografias 1 e 2 – Alunos do Ensino Médio – IPPOG-Masterclass – 2019.
Fonte: Arquivo pessoal da pesquisadora.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com o projeto IPPOG-Masterclasses inserido no 3o ano do Ensino Médio, proporcionamos aos alunos uma discussão da Física de Partículas não só em relação ao modelo padrão mas também à descoberta recente do Bóson de Higgs e do funcionamento do LHC. A implantação do projeto trouxe a possibilidade para que eles tivessem a oportunidade de ser guiados pela ciência na atualidade, no caso, o experimento ATLAS, que, posteriormente, de discutir os resultados dessa observação, sua pertinência e a relevância desse tipo de atividade guiada e discutida, colocando em foco o que eles têm como conteúdo nas disciplinas do ensino médio na disciplina de Física.
Os PCN+, documento que orienta a educação no Brasil, alude a importância da introdução da Física Moderna no ensino médio:
Alguns aspectos da chamada Física Moderna serão indispensáveis para permitir aos jovens adquirir uma compreensão mais abrangente sobre como se constitui a matéria, de forma a que tenham contato com diferentes e novos materiais, cristais líquidos e lasers presentes nos utensílios tecnológicos, ou com o desenvolvimento da eletrônica, dos circuitos integrados e dos microprocessadores. A compreensão dos modelos para a constituição da matéria deve, ainda, incluir as interações no núcleo dos átomos e os modelos que a ciência, hoje, propõe para um mundo povoado de partículas. (BRASIL. PCN+, 2006, p. 70).
Verificamos que as orientações curriculares afirmam que tópicos de Física Moderna são fundamentais para que o aluno tenha uma visão mais abrangente da matéria, bem como ressalta a importância do entendimento das interações no núcleo dos átomos e os modelos atuais de partículas, o que mostra que o trabalho realizado corrobora as demandas das diretrizes nacionais para a disciplina de Física.
O ensino da Física de Partículas Elementares traz uma melhor compreensão para os alunos do 3o ano quando estudam eletricidade, magnetismo e fenômenos relacionados à estrutura da matéria, fundamentais para compreensão dos fenômenos abordados neste segmento.
O trabalho já realizado por vários autores no intuito de levar a Física Moderna para o Ensino Médio, que contempla na maioria das vezes a Teoria da Relatividade ou a Mecânica Quântica e, até mesmo, a Física de Partículas, como é o nosso caso, demonstra a relevância do tema, ainda que isso deve ser amplamente discutido com os professores do ensino médio. Devemos também considerar que vários currículos de vários estados brasileiros já inseriram o tema, o que mais uma vez mostra a relevância e assertividade da ação.
No caso do estado do Rio de Janeiro, o tema não foi inserido em sua totalidade, devendo ser desenvolvido com os alunos apenas habilidades e competências relacionadas às quatro forças fundamentais da natureza. Consideramos, neste contexto, fundamental para a introdução dos conceitos principais da eletricidade, o conhecimento do Modelo Padrão e o entendimento de que prótons e nêutrons não são partículas fundamentais como os elétrons.
Com este trabalho, verificamos que a visão dos alunos a respeito do projeto é positiva sobre todos os aspectos pesquisados: da pertinência da palestra ao tempo de apresentação, às orientações dadas para análise dos eventos.
AGRADECIMENTOS E APOIOS
Agradecemos ao Laboratório de Informática do Instituto Politécnico do Rio de Janeiro – IPRJ –, de Nova Friburgo, pela utilização dos computadores para a realização da oficina e ao professor Sérgio Oliveira, pelo empenho em nos auxiliar a tornar o trabalho melhor.
REFERÊNCIAS
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