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Educação na (trans)formação para as relações étnico-sociais

Laís Melo de Andrade

Laís Melo de Andrade

Assistente Social, Especialista e Pesquisadora do Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em Comunicação, Cultura e Mídia pela Universidade Estadual de Santa Cruz. Articulista do Jornal Pensar a Educação em Pauta.

E-mail: ass.laismelo@gmail.com

A construção da história geral do Brasil é tecida pela mistura de várias etnias que por aqui permaneceram, acontece que, assim como todas as histórias contadas, existem vários lados que, por muito tempo, foram invisibilizados, como exemplo a etnia negra oriunda do continente africano, trazida pelos tráficos negreiros, iniciando a escravidão no Brasil, e a etnia indígena oriunda dos povos originários da América.

Mesmo o país se tornando independente em 1822, ainda assim, não existia independência para o povo negro, tampouco liberdade, e, mesmo com o fim da escravidão em 1888, existiam casos de escravidão por servidão e preconceito devido à não aceitação da população negra na sociedade, que por muitos anos não foi assistida socialmente, levando à vulnerabilidade social e às injustiças sociais, que aconteceram por anos e anos. 

Podemos hodiernamente debater as questões antirracistas junto às abordagens teóricas, devido à Lei 10.639/2003, que torna obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana, o que  nos ajuda a combater o racismo, a intolerância religiosa e até mesmo a falta de identidade enquanto grupo social.

Sabemos também que, mesmo havendo o advento da lei, a educação ainda esbarra no desconhecido, e basta só refletir: quantas pessoas conhecem histórias de seu próprio povo contadas nas perspectiva e visão etnicamente negra? Explanando este tema sabemos que o lugar de fala da cultura negra, por anos, foi invadido pela supremacia branca, especialmente europeia.  

Portanto, o trabalho objetiva estudar as relações existentes dentro do ambiente escolar de formação, buscando compreender como a visão estereotipada pode afetar a formação social e identitária das crianças, dos adolescentes e jovens na escola. 

Neste contexto Silva; (2014, p. 269); aborda e justifica: 

O estereótipo estrutura a imagem do sujeito, transforma a sua autoimagem e o seu corpo, tornando este em um ser desajustado na sociedade. As populações atingidas por estereótipos têm na constituição de sua identidade o peso dessas visões.  São instituídos rótulos, padrões de comportamentos e ações que acabam por marcar a corporeidade do indivíduo na sociedade. Estas diferenciações instituídas a partir das características físicas dos indivíduos acabam por modificar os corpos destes.  Assim, toda a linguagem e imagem corporal que é construída pelo indivíduo a partir de seu corpo e de seu contato com o meio onde vive é influenciada pela atuação dos estereótipos. Os comportamentos e atitudes deste corpo obedecem às ordens impostas pela cultura e pelos olhares que o outro mantém sobre ele, neste caso, olhares estereotipados, que influenciam diretamente em seu autoconhecimento.

A importância da cultura e história negra na sociedade e sua presença na sala de aula permite o direito da construção da identidade, o protagonismo de sua história e a educação libertadora sem tabus. Isso possibilita que crianças e jovens, no geral, conheçam os vários lados da história e da cultura do Brasil, transformando a sala de aula em um espaço multicultural de aprendizado e de troca de saberes.

Gomes (2014, p.4); afirma que a cultura é ressignificação: 

Os homens e as mulheres, por meio da cultura, estipulam regras, convencionam valores e significações que possibilitam a comunicação dos indivíduos e dos grupos. Por meio da cultura eles podem se adaptar ao meio, mas também o adaptam a si mesmos e, mais do que isso, podem transformá-lo.

A fala de Gomes só enfatiza a importância da cultura na educação; e como ela funciona na sociedade. Isso permite sermos donos da nossa história e agentes da nossa cultura, assim como os Griots e Sankofas, que transmitem as histórias e retornam ao passado para ressignificar o presente. 

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O Brasil é um país pluriétnico, logo é contestável e preconceituoso falar sobre a história de uma única etnia; a questão é que ao longo de toda trajetória do país, as narrativas são escritas pelo olhar do colonizador europeu branco, nos livros de história as conquistas são apresentadas desta mesma forma, logo, dentro do ambiente escolar, se torna algo injusto quando a maior parte da população brasileira é negra, logo a frequência desta população também faz o uso da educação, seja, em rede pública ou particular. 

A população negra, que veio da África dentro dos navios negreiros, teve sua história toda silenciada, por ser meras mercadorias, eram isentas de história, e toda a escrita contada pelos livros são descritas, na visão européia.  

Até ser reconhecida e aplicada na prática, a Lei nº 10.639/2003 percorreu um caminho de trilhas difíceis. Cabe enfatizar também que uma das mais importantes conquistas do universo educacional no país fora a alteração da lei de diretrizes e bases da educação nacional, por que ela nos dar a possibilidade de partilhar histórias, culturas e saberes diferentes das quais vivenciamos ao longo do caminho de nossas vidas.

O processo de implementação da Lei nº 10.639; vem ao encontro da CONVENÇÃO CONTRA A DISCRIMINAÇÃO NA ESFERA DO ENSINO (1960), da CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO RACIAL (1966) e da DECLARAÇÃO MUNDIAL CONTRA O RACISMO, DA CONSTITUIÇÃO FEDERATIVA DO BRASIL (1988) e DISCRIMINAÇÃO RACIAL, XENOFOBIA E AS FORMAS RELACIONADAS DE INTOLERÂNCIA (2001). 

Isso nos lembra, o que Domingues (2016); diz sobre, as resistências sempre terem existido, seja no coletivo  e em projetos universais, ou no movimento negro, a luta sempre permanece, e sempre há uma trajetória antes de uma lei sancionada.  

Em momento de maior maturidade, o movimento negro se transformou em movimento de massa, por meio da Frente Negra Brasileira. Na segunda fase (1945-1964), o Movimento Negro retomou a atuação no campo político, educacional e cultural. Com a União dos Homens de Cor e o Teatro Experimental do Negro, passou-se a enfatizar a luta pela conquista dos direitos civis. Na terceira fase (1978-2000) surgiram dezenas, centenas de entidades negras, sendo a maior delas o Movimento Negro Unificado (p. 121).

Trata-se, portanto, de uma construção histórica/ social em alcance mundial e nacional, em face dos longos anos de escravidão que discriminou povos do direito à educação e do acesso à cidadania individual e coletiva.

A lei 10.639 obriga de fato a abordar o lado da história e cultura negra, pareando às demais histórias que são ensinadas dentro da sala de aula, criando a possibilidade de reparação para os atuais e futuros estudantes. O que se pretende com isso é fortalecer a sociedade e ocupar de fato os espaços de que a população negra fora privada, esses espaços ainda são dentro dos livros de história reativando o legado da cultura, sabedoria, ciência, para a emancipação dos jovens negros de hoje.  

Conclusão

Este trabalho apresenta apenas uma reflexão sobre a lei 10.639/2003, e como ela pode mudar paulatinamente a sociedade que por anos teve um modelo de educação colonizadora, reflete também sobre o poder da sala de aula em demonstrar as histórias e culturas diferentes, a mérito de cada identidade e como ela está inserida em nossos dias.

É fundamental para formação da população pós-moderna compreender que nossa origem enquanto país e comunidade, – que somos multicultural que em nossas veias correm sangue de diversas culturas – assim propomos estudos decoloniais, que liberte e valorize todas as culturas e não algumas,  a educação quando é libertadora cria espaços para uma formação saudável, para isso é preciso desaprender tudo aquilo que nos prende ao racismo, sexismo e pensamentos colonizadores.

Lembrando que, as bases do racismo prevalecente em nossa sociedade estão sustentadas em três pilares: no campo estrutural, institucional e individual. Ou seja, temos ainda três pilares para desconstruir e formar novas ideias para reconstruir pensamentos e atitudes.  A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), do ano de 2019, relatou que 46,8% da população se autodeclarou como parda e 9,4% como preta, ou seja, 56,2% da população brasileira é negra, mas não goza das mesmas oportunidades de realização de bem-estar e de direitos no tratamento que recebem da sociedade. 

Logo se vê; que a educação é importante para instruir os jovens para a sociedade, sobre as diferenças; O mais importante disso tudo é saber que quando há uma educação/história saudável, há um aluno emancipado que sabe discernir quando a educação atua respeitando e celebrando a diversidade ou quando a educação discrimina e causa sofrimento na sociedade. 

Referências

DOMINGUES, Petrônio. Movimento negro brasileiro: alguns apontamentos históricos. Tempo [online], vol.12, n.23, p. 100-122, 2007. Disponível em: < http://dx.doi.org/10.1590/S1413-77042007000200007> acesso em: 11/10/2020.

MEDEIROS, João Bosco. Redação Científica: a prática de fichamentos, resumos, resenhas/ João Bosco Medeiros. – 12. ed. – São Paulo: Atlas,2014.

GOMES, N.L. Educação, identidade negra e formação de professores/as: um olhar sobre o corpo negro e o cabelo crespo. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.29, n.1, p. 167-182, jan./jun. 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ep/v29n1/a12v29n1.pdf> Acesso em: 05/09/2020.

SILVA, Joyce Gonçalves da. Corporeidade e identidade, o corpo negro como espaço de significação. Salvador BA: UCSal, 8 a 10 de outubro de 2014, ISSN 2316-266X, n.3, v. 17, p.263-275. Disponível em: < http://aninter.com.br/Anais%20CONINTER%203/GT%2017/18.%20SILVA.pdf> Acesso em: 05/09/2020.

XXXXX, XXXXXXX. Revista Brasileira de Educação Básica, Belo Horizonte – online, Vol. 6, Número Especial Bicentenário da Independência,setembro,2022, ISSN 2526-1126. Disponível em: . Acesso em: XX(dia) XXX(mês). XXXX(ano).

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