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Teoria e práxis na educação para os Direitos Humanos

João Paulo Lisbão Nanô

João Paulo Lisbão Nanô

Graduado e Licenciado em História pela Universidade de São Paulo, Brasil, realizou iniciação científica sob orientação do Prof. Dr. Carlos Roberto F. Nogueira (2007-2008). Foi integrante do Grupo de Estudos Medievais Portugueses (USP/ UFRJ, 2007-2008) e como pesquisador graduando da Cátedra Jaime Cortesão (USP, 2007-2008). Atuou como professor de História, Filosofia e Sociologia na rede estadual de educação de São Paulo (2012-2017) e na rede privada (2017). Desenvolveu o Projeto “Leituras da Atualidade: Política, Cidadania e Autonomia” ao atuar como professor de apoio a aprendizagem (PAA) na rede estadual de Educação de São Paulo (2013-2014). Atualmente é professor de História na Rede Municipal de Ibirité/MG, além de professor coordenador de escola e pesquisador ligado ao Projeto “Escola Cidadã” da Secretaria Municipal de Educação de Ibirité/MG.

E-mail: jpnano3@gmail.com

INTRODUÇÃO

Os Direitos Humanos são um marco legal de importância central em qualquer democracia, mas na sociedade brasileira, em parte pelo desconhecimento de sua natureza, em parte pela desinformação veiculada através da mídia televisiva e da internet (em especial nas redes sociais), são atacados por parte significativa da sociedade que os veem como impeditivos da justiça e da pacificação de uma sociedade marcada pela violência e claros sinais de barbárie.

Tendo em vista a desinformação corrente, que veicula que direitos humanos existem para proteger apenas infratores da lei, entendemos ser fundamental o tratamento da temática dos direitos humanos no ambiente escolar de forma ampla e transdisciplinar.

Para tanto, este trabalho busca através da análise dos principais documentos norteadores nacionais e internacionais acerca do ensino em direitos humanos e do cotejamento de autores que se debruçam sobre a temática, vislumbrar e apontar caminhos para a efetivação da interlocução entre teoria e práxis no ensino de direitos humanos.

EDUCAÇÃO PARA OS DIREITOS HUMANOS E SEU MARCO LEGAL

O ensino acerca dos direitos humanos em ambiente escolar é amparado por uma série de documentos, políticas públicas e um largo marco legal, tanto nacional quanto internacional. Dentro destes podemos salientar a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU (1948), da qual o Brasil é signatário, que afirma em seu artigo 26 inciso 2: “A educação deve ser orientada para o pleno desenvolvimento da personalidade humana e para o fortalecimento do respeito aos direitos humanos e liberdades fundamentais. Deve promover a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações, grupos raciais e religiosos.”

Ainda no âmbito da ONU, temos o PMDH (Programa Mundial dos Direitos Humanos) que aponta que a educação contribui também para:

a) criar uma cultura universal dos direitos humanos;
b) exercitar o respeito, a tolerância, a promoção e a valorização das diversidades (étnico-racial, religiosa, cultural, geracional, territorial, físico-individual, de gênero, de orientação sexual, de nacionalidade, de opção política, dentre outras) e a solidariedade entre povos e nações;
c) assegurar a todas as pessoas o acesso à participação efetiva em uma sociedade livre. (PMDH, 2005, p. 25 apud: Machado e Paudeto 2010, p. 241)

Na esfera nacional o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH, 2007), reafirma o compromisso do Estado brasileiro com a efetivação dos direitos humanos e seu ensino e

ao mesmo tempo em que aprofunda questões do Programa Nacional de Direitos Humanos, o PNEDH incorpora aspectos dos principais documentos internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário, agregando demandas antigas e contemporâneas de nossa sociedade pela efetivação da democracia, do desenvolvimento, da justiça social e pela construção de uma cultura de paz. (PNEDH, 2007, p.10)

O PNEDH e sua aplicação tem como premissas:

a) apreensão de conhecimentos historicamente construídos sobre direitos humanos e a sua relação com os contextos internacional, nacional e local;
b) afirmação de valores, atitudes e práticas sociais que expressem a cultura dos direitos humanos em todos os espaços da sociedade;
c) formação de uma consciência cidadã capaz de se fazer presente nos níveis cognitivo, social, ético e político;
d) desenvolvimento de processos metodológicos participativos e de construção coletiva, utilizando linguagens e materiais didáticos contextualizados;
e) fortalecimento de práticas individuais e sociais que gerem ações e instrumentos em favor da promoção, da proteção e da defesa dos direitos humanos, bem como da reparação das violações. Sendo a educação um meio privilegiado na promoção dos direitos humanos, cabe priorizar a formação de agentes públicos e sociais para atuar no campo formal e não formal, abrangendo os sistemas de educação, saúde, comunicação e informação, justiça e segurança, mídia, entre outros (PNEDH, 2007, p. 10).

DA TEORIA A PRÁXIS, DA PRÁXIS A TEORIA

Tendo em vista este marco legal, entendemos que a educação em direitos humanos se dá por duas vias: A educação para os direitos humanos e a educação através dos direitos humanos. Essa premissa tem como fundamento a ideia de que não basta uma formação teórica para consolidar as noções de direitos Humanos, mas é necessária a ação prática, em que a lógica democrática, o fomento de relações empáticas e ações coletivas internalizem esses ideais no aluno e desta forma criem junto a eles sentido e significado para essa prática pedagógica.

Nesse sentido, Calau, Lira e Sponchiado (2015) afirmam que:

educar em Direitos Humanos, é educar a partir da prática, para a construção comunitária da cidadania e a participação ativa no coletivo, para uma formação ética, crítica e política, possibilitando que a pessoa ou grupo social se reconheça como sujeito de direitos, exercendo e promovendo ao mesmo tempo em que reconhece e respeita os direitos do outro. (CALAU, LIRA, SPONCHIADO, 2015, p. 3950)

Para tanto, a abordagem pedagógica deve ser permeada por uma visão de que a educação se realiza enquanto prática da liberdade e da agência dos educandos. Segundo Machado e Paudeto (2010)

é na educação como prática de liberdade, na reflexão, que o indivíduo toma para si seus direitos como fatos e realidade (…) E é por isso que a educação, seja ela familiar, comunal ou institucional, se constitui como um direito, um direito humano. É, pois, através dela que reconhecemos o outro, os valores, os direitos, a moral, a injustiça, nos comunicamos, ou seja, os elementos que nos cercam enquanto indivíduos sociais. (MACHADO e PAUDETO, 2010, p.237 – 238)

O elemento empático, de reconhecimento do outro é de suma importância em um cenário social onde, segundo Bauman (2012), todas as relações são permeadas pelo seu caráter, líquido e ambivalente e onde a adiaforização (exclusão do indivíduo do domínio da avaliação moral) se impõe  por meio de uma relação consumidor-mercadoria, ou seja, as relações inter-humanas e os direitos e acessos a estes deixam, cada vez mais, de serem mediados pelo reconhecimento do outro enquanto sujeito de direitos, enquanto agente, e passam a ser mediados por relações de mercado e avaliações a partir dos critérios de valoração impostos por este.

Para a efetivação desta premissa, diversas abordagens metodológicas são necessárias, visando não só o contato do educando com os aspectos conceituais e teóricos acerca do papel dos Direitos Humanos no âmbito da legislação e atuação dos legisladores, mas também criando espaços de participação ativa do corpo discente a partir de espaços de debate e promoção de atividades coletivas junto à comunidade escolar.

Dentre as estratégias para a efetivação desta premissa podemos destacar o uso de debates entre os educandos a partir da análise de situações problema, a integração da escola junto a movimentos sociais engajados pela luta de direitos, seja através de palestras e/ou ações integradas, e o uso de atividades lúdicas e artísticas como teatros e confecção de material audiovisual. Por fim, e não menos importante, a consolidação de práticas democráticas e de ação coletiva nas escolas que fomentem a agência dos educandos e o contato prático com a efetivação dos direitos humanos, seja através de grêmios estudantis e outras instâncias consultivas e ou deliberativas que integrem alunos, comunidade, corpo docente e gestão no fomento do conhecimento e efetivação dos direitos humanos na comunidade escolar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nessa perspectiva, a atuação e formação cidadã dos alunos, não se restringe apenas ao conhecimento dos Direitos Humanos em si, mas no entendimento de seu caráter primordial nos debates acerca dos direitos do cidadão, dos deveres do Estado e na definição das políticas públicas.

Ao entendermos como central para a formação democrática do corpo discente o reconhecimento dos Direitos Humanos como marcos fundamentais da sociedade brasileira e da promoção de uma vida em comunidade mais tolerante e respeitosa, visamos desconstruir as concepções deturpadas, assim como o senso comum acerca da questão e desta forma contribuir para que novas formas de sociabilidade, mais humanas e mais significativas possam ser fomentadas entre os estudantes, seus professores e comunidade.

 

REFERÊNCIAS

ASSEMBLEIA GERAL DA ONU. “Declaração Universal dos Direitos Humanos”. 217 (III) A. Paris, Disponível em: https://www.ohchr.org/EN/UDHR/Documents/UDHR_Translations/por.pdf, acesso 30  mar. de 2018 às 16:30

BAUMAN, ZYGMMUNT & DONSKIS, LEONIDAS, Cegueira Moral: a perda da sensibilidade na modernidade liquida, Zahar, Rio de Janeiro, 2013

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Diretrizes nacionais para a educação em direitos humanos. Brasília, DF: MEC, 2012. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=32131-educacao-dh-diretrizesnacionais-pdf&Itemid=30192. Acesso em: 9 jun. 2018 às 14:22.

______, Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos: 2007. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007. Disponível,  em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=2191-plano-nacional-pdf&Itemid=30192, acesso 9 jun. 2018 às 14:25

CULAU, JÚLIA , LIRA, DAIANE & SPONCHIADO, DENISE APARECIDA MARTINS, Educação em direitos Humanos: Um desafio da sociedade e da escola, in: Anais EDUCERE, p. 3949-3960, PUC-PR, Curitiba, 2015. Disponível em: http://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2015/18221_7983.pdf, acesso 30 mar. de 2018 às 16:25

MACHADO, ÂNGELA VIANO & PAUDETO, MELINA CASARI, Educação e direitos humanos: desafios para a escola contemporânea, In: Cad. Cedes, Campinas, vol. 30, n. 81, p. 233-249, mai.-ago. 2010

NANÔ, João Paulo Lisbão. Revista Brasileira de Educação Básica, Belo Horizonte – online, Vol. 2, Número Especial Educação e Democracia, outubro, 2018, ISSN 2526-1126. Disponível em: . Acesso em: XX(dia) XXX(mês). XXXX(ano).

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