Mãos De Uma Criança Tocando Flauta Destaque Texto01 Número6 RBEB Redimensionada

Ensino coletivo de flauta doce na educação básica

Thelma Taets

Thelma Nunes Thaets

Doutoranda na Faculdade de Educação da UFRJ. Mestre em Educação Musical pela Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ. Licenciatura Plena em Música pela Faculdade de Educação da UFRJ e Bacharel em Piano pela Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ. Foi Autora Responsável do Projeto de Educação Musical para Educação Infantil autorizado pela Secretária Municipal de Educação do Rio de Janeiro realizado no Centro Integrado de Educação Pública (CIEP) Compositor Donga – VII CRE no período de 2004 a 2009. É Professora Efetiva da rede pública de Educação Básica da Cidade do Rio de Janeiro, lotada no Núcleo de Arte da Escola Municipal Silveira Sampaio. É Professora da rede particular no Ensino Fundamental no Colégio Garriga de Menezes na qual tem seu próprio Guia de Orientações em 03 Volumes adotados pela instituição para uso nas aulas de Educação Musical. 

E-mail: thelmataets@hotmail.com

foto-rosto

Gunnar Glauco De Cunto Taets

Professor Adjunto da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Campus Macaé. Membro do Grupo de Pesquisa Integrada em Saúde e Laboratório de Biociências da Motricidade Humana. Doutor em Ciências. Musicoterapeuta.

E-mail: masterufrj@gmail.com

foto judith

Maria Judith Sucupira da Costa Lins

Pedagoga pela Faculdade de Filosofia do Recife (1969), mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1972) e doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1996). Membro da Association for Moral Education desde 1999 e Membro do Comitê de Avaliação de Teses para o prêmio anual Association for Moral Education Kuhmerker Dissertation Award desde 2012. Desenvolveu pesquisa de pos-doutoramento sobre Filosofia da Educação e Ética, com trabalho final na Association for Moral Education Conference, Chicago, USA, 2002. Professora Associada do Departamento de Fundamentos da Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Coordenadora de pesquisas no Grupo de Pesquisas de Ética e Educação – GPEE da UFRJ. Atuação nas seguintes áreas: Ética, Escola e Educação Moral, História da Educação e Filosofia da Educação e Educação Brasileira e Psicologia da Educação (Desenvolvimento Infantil e do Adolescente e Aprendizagem).

E-mail: mmariasucupiralins@terra.com.br

INTRODUÇÃO

A flauta doce soprano é um instrumento tradicionalmente utilizado nas classes de educação musical das séries iniciais e intermediárias do ensino fundamental público e privado da Educação Básica. Como afirma Paoliello (2007, p. 2), nos anos 1930, a partir do trabalho de Edgar Hunt, o instrumento foi introduzido nas escolas da Europa como veículo de iniciação musical e, posteriormente, na América, passando, assim, a adquirir uma função educativa bastante marcante. No Brasil, a partir dos anos 1960, vários pioneiros iniciaram o ensino da flauta doce nas escolas, tendo se destacado a Professora Helle Tirler, que formou uma geração de flautistas no Rio de Janeiro (AUGUSTIN, 1999, p. 45) e ainda, ou particularmente, formando grupos de onde saíram flautistas que, por sua vez, formaram novos grupos (PAOLIELLO, 2007, p. 2-3).

Dos métodos tradicionais e popularizados dentro da literatura da Flauta Doce Soprano, que trazem a nota Si como posição inicial, observa-se que essa nota não favorece a aprendizagem motora e a grafia musical (TAETS, 2012). A fundamentação teórica para tal afirmação está pautada nos seguintes teóricos: Vygotsky (1989), Ausubel (2001) e Small (1995).

Faz-se necessário estudos que abram caminhos para novas propostas metodológicas, como destacam Requião (1998), Parente (2006), Paoliello (2007) e Taets (2012), tendo em vista um início sólido e atento aos recursos do instrumento, aproveitando sua facilidade inicial e viabilizando um aprofundamento posterior. Os estudos do neurologista britânico, Dr. Oliver Sacks (2007) tem trazido grande contribuição para os estudos ao afirmar que a atividade musical envolve várias funções do cérebro (emocional, motora, cognitiva) muito mais do que as que usamos para o outro grande feito humano, a linguagem. Por isso, a música é uma forma tão eficaz de aprendizagem, o que vem fortalecer essa proposta de ensino e aprendizagem a partir das duas mãos na dedilhação da flauta doce desde os primeiros contatos com o instrumento. É importante mencionar que o Método Suzuki de Flauta Doce[1] faz uso da terminologia “posição fechada” e “posição aberta” e inicia o ensino e aprendizagem da flauta doce a partir da nota Ré, em “posição fechada” e apoiada no equilíbrio das duas mãos, o que vem a fortalecer o direcionamento apresentando neste estudo.

Pode se entender por “posição aberta” a posição na qual a maioria dos orifícios da flauta doce encontra-se aberta para obter o som da nota Si, na qual o aluno usa apenas o polegar e o indicador da mão esquerda na posição de dedilhação para a produção deste som. Dos sete orifícios dispostos ao longo do corpo da flauta, fecha-se o orifício localizado na parte posterior da flauta doce e apenas um na frente, junto ao bocal: esta é a “posição aberta” da nota Si, conforme se observa na Figura 1 abaixo.

Figura 1 – Nota Si tocada em “posição aberta”.

Fonte: Dados da pesquisadora, com base em Taets, 2012.

A “posição aberta” é introduzida pela nota Si e, na sequência, o Lá e o Sol são apresentados. Nota-se que a mão direita permanece aberta, sem posição definida, fato que pode proporcionar uma posição inadequada de mãos. O aluno pode não ter domínio suficiente para distribuir o peso da flauta doce entre o queixo e o polegar esquerdo e, ao mesmo tempo, pode deixar os dedos da mão direita em estado de espera acima dos orifícios. Nesse caso, os dedos da mão direita é que estão se apoiando na flauta doce, quando o correto seria que os dedos da mão direita participassem da sustentação do instrumento em vez de se apoiarem nele.

A proprioceptividade ou o sentido corporal de espaço e movimento são ainda campos pouco explorados segundo Galvão e Kemp (1999) e Pederiva (2004), podendo ter grandes implicações para o ensino-aprendizagem de instrumentistas. É o chamado de “sentido muscular”, o qual permite muitas impressões a serem armazenadas em uma memória muscular, que recorda movimentos que foram feitos. Por meio do movimento do tato, o aluno vai armazenar os movimentos realizados pelos dedos e mãos para tocar as posições das notas na flauta doce; e pelo sentido visual, vai utilizar-se da imitação a partir dos modelos que ele tem em sala de aula: professor e alunos. Dessa maneira, é importante o uso das duas mãos com posições definidas para favorecer o uso correto dos movimentos das mãos e dedos, em prol da performance, o que Álvares (2005) destacou como a necessidade de observar a propriocepção, desde os primeiros contatos com o instrumento.

Diferente da proposta da “posição fechada” usada por Suzuki (1994, 2011) que tem início na nota Ré, esse aprendizado de iniciação à flauta doce apresentado neste artigo tem início na nota Mi. Dessa forma, propõe-se que as duas mãos estejam atuantes e participativas na dedilhação de forma que o equilíbrio tátil cinestésico possa ser melhor evidenciado.

A primeira lição começa com a nota Mi e, para se obter o som da referida nota, é preciso colocar os dedos da mão esquerda da seguinte maneira: (a) polegar no orifício da parte de trás; (b) indicador, médio e anelar fechando os orifícios da frente, próximos à embocadura; e (c) a mão direita, na sequência, utilizando o dedo indicador e médio, como demonstrado na figura a seguir.

Figura 2 – Nota Mi tocada em “posição fechada”.

Fonte: Dados da pesquisadora com base em Taets, 2012.

Durante mais de 15 anos de trabalho no ensino e aprendizagem da flauta doce utilizando o método inicial da nota Si (“posição aberta”), foi possível perceber várias dificuldades encontradas pelos alunos iniciantes. Simultaneamente, o aluno precisa sentir o instrumento e emitir o sopro para produzir o som solicitado pelo professor, o que dá início a um complexo processo de aprendizagem cognitiva. É uma tarefa que pode ser conduzida mais facilmente quando o peso da flauta doce é distribuído entre as duas mãos (“posição fechada”) que atuam simultaneamente no apoio e no dedilhado, mão esquerda e mão direita, fechando suavemente a maioria dos orifícios no corpo da flauta doce, como demonstram estudos, dentre outros, de Ilari (2003), Pederiva ( 2004 ), Lage (2002 ), Galvão e Kemp (1999), Suzuki (1994, 2011), Álvares, (2005).

Nos estudos da neurociência, particularmente nos estudos da proprioceptividade, sensação e percepção do movimento, encontram-se estudos científicos indicativos para a observância do movimento corporal, em relação ao aprendizado e à performance de instrumentos musicais desde seus primeiros contatos. Santos (2001) ao se reportar à Dalcroze, afirma que é indispensável à relação do professor com o atual, com o futuro, com a renovação e com os novos materiais e instrumentos de criação. É nessa perspectiva que reafirmamos a importância do estudo biofisiológico na relação corpo-mente observada na memória corporal, na interação afetivo-cognitiva e nas formas diferentes de aprender e ensinar.

Álvares (2005) destaca que a proprioceptividade vem apoiar a capacidade de resposta sensório-motora pelo diálogo entre as duas mãos desde o contato inicial com a flauta doce, como também concorrer para a melhor distribuição do peso do instrumento entre as duas mãos. Dessa forma, dá-se a devida importância à conscientização da proprioceptividade, princípio que norteou esta pesquisa no que se refere à mudança da posição inicial no estudo da flauta doce, do conceito inicial da nota Si, “posição aberta”, para o conceito inicial da nota Mi, “posição fechada”. Lage et al (2002), afirmam que o estudo da aprendizagem motora seria de particular interesse tanto para o intérprete quanto para o professor de música, pois, a aplicação de conhecimentos que regem o movimento, pode buscar uma diminuição significativa dos erros de performance, bem como o controle maior da variabilidade dos movimentos corporais. Esses autores destacam a importância da aproximação entre educadores musicais e os professores de instrumentos, e propõem a observação de cunho científico nas questões do cotidiano.

Quanto à grafia, vários estudos de metodologias alternativas serviram de base, com destaque para Pataro (1985) por meio da Pauta Gradativa e Drummond (1988) e Álvares (2005) com a construção da pauta de duas e três linhas até chegar-se ao pentagrama. Dessa forma a metodologia em Mi (TAETS, 2012), durante as três semanas iniciais, promoveu o ensino e aprendizagem da flauta doce por meio da técnica de imitação. Após esse período passou a fazer uso da pauta de duas linhas e três linhas, desenhadas com um espaçamento maior entre as linhas. Gradativamente, chegou ao uso do pentagrama. Segundo Fernandes (1998), a escrita alternativa deve ser simples e manter o vínculo com a escrita convencional, o que foi observado pela pesquisadora. Dessa forma, houve a aplicação de uma diferenciação progressiva, pois, passo a passo, os alunos foram destacando as semelhanças e as diferenças entre os sons. Ao se depararem com a nota Si, símbolo colocado na terceira linha do pentagrama, no decorrer da sétima de aula foi observado a consolidação de uma aprendizagem significativa (AUSUBEL, 2003).

OBJETIVO

Avaliar a aplicação da abordagem pedagógica a partir da nota Mi como condutora da aprendizagem motora no desempenho instrumental e facilitador da compreensão da grafia musical no ensino coletivo da flauta doce na Educação Básica.

METODOLOGIA

Trata-se de pesquisa-ação de natureza descritivo-explicativa com uma abordagem qualitativa realizada no Núcleo de Arte da Escola Municipal Silveira Sampaio na cidade do Rio de Janeiro.

A população do estudo foi composta por quatorze alunos, na faixa etária de sete a quatorze anos, sendo nove meninos e cinco meninas, e a maioria dos alunos veio das séries iniciais do ensino fundamental da Educação Básica. As aulas foram realizadas com duração de oitenta minutos, duas vezes na semana, como atividade extracurricular.

Os dados foram coletados entre 2014 e 2016. A técnica escolhida para a coleta dos dados foi a observação participante. Tivemos a colaboração e participação de dois estagiários, alunos graduandos em Licenciatura em Música, no desenvolvimento das aulas de flauta doce e no processo de avaliação dos alunos, no período letivo de 2010. Além disso, contamos, ainda, com a colaboração de um professor de música da rede pública de ensino que fez os arranjos e as gravações do repertório proposto e trabalhado.

A proposta compreendeu aulas ministradas durante três meses consecutivos e durante doze semanas, num total de 24 aulas. Foi utilizado um repertório específico de doze músicas, uma música para cada semana.

Cada aluno foi identificado por uma letra, em ordem alfabética e avaliado de acordo com o desenvolvimento observado em sala de aula. A avaliação do desempenho do aluno para a realização da tarefa foi analisada por meio de uma mensuração com três níveis: Regular (R) para o aluno que não atingiu os objetivos propostos pelo estudo da semana, apresentando dificuldades e necessidade de repetição dos conteúdos; Bom (B) para o aluno que demonstrou compreensão e empenho na realização das tarefas propostas na semana e teve uma frequência igual 90% das aulas; e Muito Bom (MB), para o aluno que evidenciou independência na realização das atividades propostas na semana e uma atuação espontânea de mediador entre o conhecimento e a realização das tarefas, cooperando ativamente com o grupo e obtendo 100% de frequência.

Foram utilizadas as seguintes músicas:

Música 1 – Criança 2000. Autor: Pe. Zezinho, adaptada para Criança 2010 atendendo o ano em que ocorreu esta pesquisa;

Música 2 – Eu conto pra você. Autora: Jael Santana;

Música 3 – O trem de ferro. Canção brasileira de tradição oral;

Música 4 – Pega no ganzê. Canção brasileira de tradição oral, em cânone;

Música 5 – Chorinho. Autora: Maria Meron;

Música 6 – Kamalondo. Canção tradicional africana;

Música 7 – Sinos de Natal, do original Jingle Bells. Autor: James Pierpont;

Música 8 – É Natal. Autor: Marco Antonio Hailer;

Música 9 – Noite Feliz. Autor: Franz Gruber;

Música 10 – Aleluia. Autor: William Boyce;

Música 11 – Asa Branca. Autor: Luiz Gonzaga;

Música 12 – Tema da Vitória. Autor Eduardo Souto Neto.

RESULTADOS

Os resultados podem ser observados no Gráfico 1, a seguir.

Gráfico 1 – Leitura e grafia: avaliação do desenvolvimento geral.

Fonte: Dados apurados pela pesquisadora.

 

Desde o primeiro contato do aluno com a flauta doce a proposta interativa se fez presente por meio do cantar e tocar, do ouvir e tocar, dos gestos expressivos e movimentos corporais. Para Small (1995), a performance musical tem início na preparação dos espaços para a realização das atividades relacionadas à natureza de uma performance. É o que observamos com a arrumação inicial das cadeiras em círculo e a distribuição das flautas doces, pois a maioria dos alunos utiliza o instrumento fornecido pelo professor. Podemos, portanto, destacar que o pensamento de Small (1995) condiz com o que acontece nas nossas aulas: um “ritual” no espaço escolar.

Nos primeiros momentos, não houve preocupação com a grafia e sim com a produção do som, com o equilíbrio do instrumento e com o movimento das mãos e dedos no instrumento para estabelecer o uso da “posição fechada” na condução da nossa proposta.

Ao analisar os resultados obtidos nas duas primeiras aulas observamos que a maioria dos alunos tiveram facilidade para a execução das notas Mi e Fá. É importante criar um vínculo a um conhecimento prévio para ancorar a nova informação e “é a partir do que o aluno já aprendeu que todas as experiências acontecerão e todas as aprendizagens propostas pelo professor poderão ser adquiridas” (LINS, 2004, p. 632).

Fundamentados nessa afirmação utilizamos o recurso da numeração relacionada às posições das notas Mi e Fá, o que pode ter contribuído para a fixação do dedilhado e um bom índice na execução instrumental dos alunos.

Por volta da terceira semana de aula, concordamos e apontamos para a necessidade de tornar a apresentar o conceito Mi-Sol que evidencia a articulação entre as “posições aberta e fechada” em outras atividades, para que os alunos pudessem adquirir o domínio e a desenvoltura esperados. Ausubel (2003) destaca a importância de reapresentar os conceitos em estudo em novos contextos. E ao mesmo tempo, recordamos a ideia de Zona de Desenvolvimento Proximal apresentada por Vygotsky (1989) ao observarmos que o aluno estava em processo de aprendizagem evidenciando o seu desenvolvimento potencial.

Um aspecto importante percebido durante a quinta semana de aula, foi a permanência do aluno na escola que nos leva a refletir sobre a performance musical e o espaço físico e social onde ela aconteceu, e “assim nós perguntamos quais significados são construídos em uma performance” (SMALL, 1995, p. 2). Sabemos que esses significados começam a ser construídos nas atividades que envolvem a performance, desde a arrumação e preparação dos materiais até os relacionamentos interpessoais entre os participantes, que transformam cada encontro em momentos únicos, culturalmente, cognitivamente, socialmente e afetivamente.

Conforme as semanas foram passando, o estudo se apresentava de maneira progressiva e contínua e os alunos tiveram a curiosidade aguçada e vontade de ultrapassar os limites. Observamos que vários se lançaram ao desafio de tocar a música proposta de forma integral. O que mais chamou a nossa atenção foi o crescente entusiasmo dos alunos diante do progresso alcançado, bem como o domínio das habilidades motoras.

É interessante destacar a lição repassada por Vygotsky (2003) sobre a importância das emoções e sentimentos, na aquisição e apreensão de conhecimentos:

Não sei por que em nossa sociedade formou-se um critério unilateral sobre a personalidade humana, nem por que todos relacionam dons e talento apenas ao intelecto. Além de ser possível pensar com talento, também se pode sentir talentosamente. O aspecto emocional da personalidade não tem menos importância que outros e constitui objeto e a preocupação da educação, na mesma medida que o intelecto e a vontade. O amor pode conter tanto talento e inclusive genialidade quanto a descoberta do cálculo diferencial. Em ambos os casos o comportamento humano adota formas excepcionais e grandiosas (VYGOTSKY, 2003, p. 122).

Essas questões abordadas por Vygotsky (2003) foram observadas uma vez que quanto mais os alunos se sentiram confiantes, mais eles se entusiasmaram e melhor se deu o aprendizado. Essa constatação foi verificada e pôde ser observada, por meio dos gráficos apresentados: a cada avaliação os alunos foram obtendo um desempenho melhor nas atividades propostas em sala de aula.

Já na nona semana de aula, por meio da descrição e exposição oral, os alunos relataram as diferenças percebidas na representação simbólica das notas Mi-Sol, Ré-Fá e Fá-Lá que culminou com a realização de uma atividade em folha pautada. Ao destacarem as diferenças das posições de notas de linha e notas de espaço, percebeu-se a prática da reconciliação integradora e interativa entre os conhecimentos adquiridos e os novos, conceito fundamentado na Teoria de Ausubel (2003).

Vygotsky (1989) afirma a que a percepção do conjunto precede a de partes isoladas, ou seja, o aprendizado de um conteúdo deve ser pelo sentido total. Este é um importante fundamento que observamos ao apresentar a canção na íntegra aos alunos, por meio do canto e das partituras em níveis diferentes de conhecimento. Procurou-se observar, dessa maneira, o desenvolvimento potencial dos alunos, valorizando aquilo que o aluno pode realizar com a ajuda do professor e/ou de colegas.

Os resultados da Iniciação à Flauta Doce, realizada em doze semanas e em período correspondente a três meses de aulas, proposto no estudo, apresentaram um desenvolvimento real e significativo.

Segundo Ausubel (2003) houve a aplicação de uma diferenciação progressiva, quando, passo a passo, os alunos foram destacando as semelhanças e as diferenças entre os sons. Eles observaram as notas de “posição aberta” e “fechada”, as notas de linha e de espaço e foram estabelecendo novas relações entre os conceitos e obtendo uma melhor fixação dos conhecimentos.

Vimos que algumas estratégias se destacaram durante a evolução da aprendizagem de flauta doce. Podemos citar, no tema grafia, o uso das canetas coloridas, tipo marca texto e a forma como e porque foram utilizadas; no tema execução e aprendizagem motora, o uso da técnica do queixo e quando foi aplicada. As notas destacadas são relacionáveis à escuta, às notas guias ou guide notes. Essas notas se destacam na harmonia da música em estudo e o professor as utiliza, proporcionando, pouco a pouco, um melhor e atento desenvolvimento auditivo. Apontamos essas estratégias pelo seu ineditismo e porque essas ferramentas poderão instigar e fundamentar outras discussões sobre novas maneiras de proceder em prol do conhecimento.

Em uma “oficina, a música não é tomada pronta, a ser aprendida e repetida, mas a ser construída pela ação do aluno” (PENNA, 2010, p. 27), fato que pudemos observar no cotidiano das nossas aulas, visto que trouxe em si, a possibilidade do novo.

CONCLUSÃO

Nas atividades relatadas nesta pesquisa, a abordagem inicial dos conceitos musicais a partir da nota Mi traduziu em respostas pedagógicas novas formas de solucionar as necessidades que encontramos no cotidiano da nossa sala de aula e que, no futuro, poderá ser a resposta para outras salas de aula.

Soluções são necessárias para atender situações imprevistas, principalmente daquele que vive em constante atualização entre o antigo e o novo, o atual e o que deve ser mudado. Por meio de questionamentos, cada músico-pedagogo pode ajudar a renovar o ensino da música.

No processo de Iniciação à Flauta Doce desenvolvido neste estudo, ficou evidenciada a atenção que é dada à articulação entre a mão esquerda e a mão direita, à posição correta dos dedos e mãos e ao equilíbrio e sustentação do instrumento desde os primeiros contatos do aluno com o instrumento musical. Esses elementos são muito importantes na construção do suporte técnico para o desenvolvimento da execução instrumental, pois têm estreita relação com os preceitos relativos à aprendizagem motora, nesta nova perspectiva.

A partir de uma prática musical e escolar sociointeracionista que viabilizou uma imersão em ambiente musical, chegamos a um exemplo de aprendizagem que gerou o desenvolvimento das habilidades musicais e que mostraram resultados significativos.

 

 

 

REFERÊNCIAS 

ÁLVARES, S. L. A. Teorias do desenvolvimento cognitivo e considerações sobre o aprendizado da música. In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE COGNIÇÃO E ARTES MUSICAIS, 1., 2005, Curitiba. Anais… Curitiba: UFPR, 2005. p. 63-71.

AUGUSTIN, K. Um olhar sobre a música antiga: 50 anos de história no Brasil. Rio de Janeiro: [s.n.], 1999.

AUSUBEL, D. P. Aquisição e retenção de conhecimentos: uma perspectiva cognitiva. Lisboa: Plátano Edições Técnicas, 2003.

BRASIL. Lei n. 11.769, de 18 de agosto de 2008. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação, para dispor sobre a obrigatoriedade do ensino da música na educação básica. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF 19 ago. 2008. Seção 1, p. 1.

DEWEY, J. Democracia e educação. 2 ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1952.

DRUMMOND, E. Iniciação à flauta doce. Ceará: Softcraft Publicações Ltda. 1988.

FERNANDES, J. N. Educação musical e fazer musical: o som precede o símbolo. Revista Plural. Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, p. 47-58, 1998.

GALVÃO, A. KEMP, A. Kinaesthesia and instrumental music instruction: some implications. Psychology of Music, Thousand Oaks, v. 27, n. 2, p.129-137,1999. Disponível em:<https://goo.gl/snAEsb>. Acesso em 21 set. 2017.

GUEST, I. Apresentação para o curso intensivo de Método Kodály. Rio de Janeiro: CIGAM, 1990. Apostila.

LAGE, G. M. et al. Aprendizagem motora na performance musical: reflexões sobre conceitos e aplicabilidade. Per Musi, Belo Horizonte, v. 5-6, p. 14-37, 2002.

LIBÂNEO, J. C

LINS, M. J. S. C. Avaliando o processo de aprendizagem. Revista Ensaio, Rio de Janeiro, v. 12, n. 42, p. 623-636, 2004.

PAOLIELLO, N. O. A flauta doce e sua dupla função como instrumento artístico e de iniciação musical. 2007. 48 f. Monografia (Licenciatura em Educação Artística) – Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2007.

PARENTE, Helder. Depoimento. Rio de Janeiro, 2006.

PEDERIVA, P. L. M. A relação músico-corpo-instrumento: procedimentos pedagógicos. Revista da ABEM, Porto Alegre, v. 11, p. 91-98, 2004.

PENNA, M. Música(s) e seu ensino. 2. ed. Porto Alegre: Editora Sulina, 2010.

______. A função dos métodos e o papel do professor: em questão, “como” ensinar música. In: MATEIRO, T.; ILARI, B. (Org.). Pedagogias em educação musical. Curitiba: Ibpex, 2011. p. 13-24.

REQUIÃO, L. Escrita: um tabu na educação musical. Revista Plural, Rio de Janeiro, v.1, p.69-80, 1998.

SACKS, O. Alucinações musicais: relatos sobre a música e o cérebro. São Paulo: Companhia das Letras. 2007.

SMALL, C. Musicking: a ritual in social space. Cielo, Texas, 1995. Disponível em: <http://www.musikids.org/musicking.html>. Acesso em: 2 jan. 2012.

SIMÃO, R. M. Jacques Dalcroze, avaliador da instituição escolar: em que se pode reconhecer Dalcroze, um século depois? Debates, Rio de Janeiro, v. 4, p. 7-48, 2001.

SUZUKI ASSOCIATION OF THE AMERICAS. Every Child Can Learn. Suzuki Twinkler, Boulder, 1998. Disponível em: <https://goo.gl/p4xudW>. Acesso em: 21 abr. 2011.

SUZUKI, S. Educação é amor. Santa Maria: Pallotti, 2. ed.1994.

TAETS, T. N. Iniciação à flauta doce: uma proposta de educação musical. Dissertação 2012. 126 f. (Mestrado em Música). Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012. Disponivel em: <https://goo.gl/HcKNFf>. Acesso em: 21 set. 2017.

VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1989.

______. Psicologia pedagógica. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2003.

[1] O Método Suzuki de Flauta Doce foi elaborado pela professora norte-americana Katherine White, que esteve no Japão, em 1974, a convite do próprio Suzuki para estudar no Instituto de Educação do Talento em Matsumoto. Em 1976 recebeu o Certificado de Professora (SUZUKI ASSOCIATION OF THE AMERICAS, 1998).

Autor: essa referência é sobre uma obra de Parente chamada Depoimento, ou é um depoimento do autor? Se for a última opção, a referência correta seria PARENTE, H. Helder Parente: depoimento [MÊS. 2006]. Rio de Janeiro: REVISTA OU JORNAL, 2006.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *