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Grupo colaborativo: Aproximação entre a universidade e a escola básica

ana lucia freire

Ana Lúcia Freire Tanaka

Mestre em Educação: Psicologia da Educação (PUC-SP), sob a orientação da professora Doutora Laurizete Ferragut Passos. Bolsista CNPq. Graduada em Pedagogia, pós-graduada em Psicopedagogia e habilitada no curso de Magistério. Especialista nas séries iniciais da educação básica. Atua como professora no ensino fundamental, assessora pedagógica, na formação de formadores e no ensino superior. Integrante do grupo de pesquisa com sede na PUC/SP – Educação Matemática, intitulado: Rede Colaborativa de Práticas na Formação de Professores que ensinam Matemática: Múltiplos Olhares, Diálogos e Contextos.

E-mail: analuciafreire@ymail.com

Laurizete Ferragut Passos

Laurizete Ferragut Passos

Possui graduação em Pedagogia, mestrado em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (1990) , doutorado em Educação pela Universidade de São Paulo (1997) e pós-doutorado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Professora aposentada da Unesp e atualmente Professora assistente da Pontifcia Universidade Católica de S.P. Foi coordenadora do GT Formação de Professores da ANPED e atualmente coordena projeto de pesquisa CAPES/INEP/SECAD -Observatório da Educação. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Formação de Professores, atuando principalmente nos seguintes temas: formação de professores, formação de professores de matemática, trabalho docente, profissionalidade docente, cursos de licenciatura, educação matemática.

E-mail: laurizetefer@gmail.com

Os cursos de licenciatura objetivam garantir ao futuro professor condições para conhecer, discutir e refletir sobre as teorias, metodologias, bem como as vivências práticas que são contempladas durante o estágio supervisionado. Essa formação inicial possibilita ao professor iniciar sua trajetória profissional, a qual irá constituir-se ao longo de sua vida como docente, em que irá vivenciar as práticas cotidianas de uma escola e conviver com situações desafiadoras, que, se confrontadas com um ambiente escolar reflexivo e/ou grupos formativos, permitirá a esse professor avançar em seu desenvolvimento profissional.

Entendendo a formação continuada de professores como um processo contínuo de reflexão e inspirado em um grupo colaborativo/reflexivo, este artigo traz evidências de que ações que promovem a parceria entre a universidade e a escola levam a bons resultados na formação de professores e, consequentemente, no aprendizado dos alunos. Isso ocorre porque a universidade, ao se aproximar da prática pedagógica das escolas, auxilia os professores nas diversas questões pedagógicas referentes à sala de aula e à formação docente.

Nesse contexto, também as parcerias das universidades com as escolas parecem potentes para o desenvolvimento de um trabalho conjunto com os professores em que os saberes teóricos e os saberes práticos sejam colocados em debate de modo que, juntos, professores da universidade e da escola básica vivenciem uma dinâmica formativa constante tendo a prática e a construção teórica sobre ela como elemento fundamental de um processo formativo conjunto. 

A RELAÇÃO UNIVERSIDADE-ESCOLA COMO PORTA DE ENTRADA

A aproximação da universidade com as escolas tem-se mostrado como possibilidade de ultrapassar os limites de uma formação inicial fechada nas paredes da universidade e distanciada das situações práticas de ensino. Da mesma forma, essa aproximação pode permitir que os professores e toda a equipe gestora se mobilizem e se integrem num processo de reflexão que articule uma colaboração com vistas a melhorar tanto a situação de trabalho quanto o conhecimento profissional.

As pesquisas realizadas por Zeichner (2010) destacam o distanciamento existente entre a universidade e a realidade das escolas de educação básica. O autor entende que a valorização do conhecimento acadêmico sobre o prático pode ser responsável por criar barreiras para essa aproximação, e propõe o conceito de um “terceiro espaço”, o que se caracteriza como um espaço híbrido nos programas de formação inicial de professores que reúnem professores da educação básica e do ensino superior, o que possibilita reunir conhecimentos prático, profissional e acadêmico promovendo novas formas de aprimorar e repensar a aprendizagem dos futuros professores. Essa proposta proporciona aos participantes momentos de trocas e aprendizados igualitários, ou seja, o acadêmico não assume um papel de superioridade sobre os professores da educação básica, mas sim uma parceria, diferentemente do que acontece nas parcerias convencionais entre escola e universidade, em que muitas vezes os participantes se relacionam de acordo com a hierarquia estabelecida pelo nível acadêmico.

O autor destaca a necessidade de esses espaços serem constituídos de forma planejada e orientada visando à aprendizagem dos professores em formação. Situações vivenciadas na prática cotidiana precisam ser valorizadas, e os estudos devem ser articulados de maneira que a aprendizagem seja significativa e que possa possibilitar mudanças na atuação dos professores da educação básica.

Um formato de formação continuada na tentativa de aproximar a universidade e a escola,descrito por Zeichner, e que tem gerado bons resultados, são os nomeados grupos colaborativos ou as comunidades de prática.

CONTEXTUALIZANDO GRUPOS COLABORATIVOS/REFLEXIVOS

Os grupos colaborativos/reflexivos são formados por pessoas que têm interesse comum por determinado tema ou assunto, porém não é necessário que todos estejam buscando um mesmo assunto ou um mesmo modo de abordá-lo, pois a diversidade de opiniões contribui muito para a aquisição de novos conhecimentos.

O surgimento de grupos colaborativos, no Brasil, envolvendo parceria entre professores universitários e professores da escola básica, tendo como foco de análise as práticas de ensinar e aprender na educação básica é um fenômeno que surgiu a partir da década de 1990 (CRECCI; FIORENTINI, 2013). A formação desses grupos, segundo os autores, se expandiu rapidamente com o crescimento dos programas de Pós-graduação em Educação Matemática e visavam à necessidade de contribuir para a formação dos futuros professores e também dos professores experientes que ensinam matemática na educação básica.

Estudos vêm mostrando que os professores da escola básica produzem conhecimento sobre a prática, podendo esse processo ser catalisado mediante colaboração dos formadores da universidade e/ou mediante engajamento dos professores em comunidades com postura investigativa sobre o que se ensina e aprende nas escolas, e o modo como essas práticas são desenvolvidas (COCHRAN-SMITH; LYTLE, 1999, apud CRECCI; FIORENTINI, 2013.

Nesse sentido, os grupos colaborativos podem se tornar espaços em que os professores podem potencializar sua capacidade reflexiva sobre sua ação docente. Santos e Mizukami (2012) em estudo sobre as manifestações de reflexibilidade num processo formativo de professores apoiam-se em Sacristán para compreender o conceito:

Capacidade de atribuir sentido às ações docentes, de argumentar sobre seus saberes, de emitir juízos sobre o que faz, como, porque, para que faz e para quem faz o ensino, de analisar e ampliar seus saberes, nos contextos em que se insere. (SACRISTÁN, 1999, p.22).

Quando os professores trabalham em comunidades ou grupos colaborativos/reflexivos, há uma busca comum em dar significado à vida profissional. Esses grupos têm algumas dimensões que os caracterizam,uma delas é o tempo. Quando os professores trabalham juntos em um grupo de investigação, necessitam de um tempo considerável para o trabalho e uma longevidade suficiente do grupo para atuar por certo período. Cada grupo tem características particulares que o move, tem suas próprias histórias. As experiências e vivências trazidas pelos integrantes é que vão, de certo modo, caracterizando o grupo.

Outra dimensão para a formação e manutenção desses grupos é a natureza do discurso. Por meio de conversas, discussões e análises, a aprendizagem vai acontecendo. A rica conversa descritiva e a escrita ajudam a tornar visível e acessível as práticas do dia a dia. A literatura teórica embasa essa prática tornando possível aos professores refletir e analisar acerca de suas práticas.

O GRUPO COLABORATIVO NO PROGRAMA OBSERVATÓRIO DA EDUCAÇÃO

 Composto por estudantes de licenciatura em matemática, estudantes de pedagogia, professores que ensinam matemática nas séries iniciais e finais da educação básica e estudantes de mestrado, mestrado profissional e doutorado, o programa Observatório da Educação (PUC/SP)teve início em junho de 2013.

Logo do Observatório da Educação – Obeduc

Por se tratar de uma rede colaborativa, o projeto proporciona aos seus integrantes a possibilidade de trocar experiências em todas as suas dimensões, sejam elas pessoais ou profissionais, promovendo uma aprendizagem mútua aos participantes, especialmente em relação às questões referentes ao ensino de matemática.

As atividades desenvolvidas nesse projeto contribuem para a reflexão e compartilhamento das necessidades formativas dos professores em relação às questões que envolvem o ensino de forma geral e, de forma mais específica, o ensino de matemática.

Os programas públicos, assim como o Observatório da Educação, são criados com o propósito de investir no desenvolvimento profissional dos professores com diferentes níveis de experiência. Alguns privilegiam a inserção à docência, outros são direcionados também para professores experientes ou alguns ainda conseguem contemplar os dois grupos de professores ao mesmo tempo.

A influência do grupo na prática pedagógica:um olhar sobre as práticas

A prática pedagógica, que é o fazer diário do professor, depende não apenas dos conhecimentos formais, adquiridos principalmente nos cursos de formação, mas essencialmente das observações que o professor faz do seu próprio trabalho, dos seus alunos, da escola, da sociedade e da reflexão diária que impõe todo trabalho pedagógico. É nesse sentido que são apontados os saberes escolares, os saberes pedagógicos e os saberes docentes e, ainda a experiência profissional como fenômenos que se misturam na atividade diária do professor. Só uma reflexão sistemática e continuada é capaz de promover a dimensão formativa da prática.

Durante os encontros houve a oportunidade de perguntar aos professores sobre o que pensavam a respeito deles mesmos enquanto profissionais depois de terem participado do grupo Obeduc, ou seja, a ideia era saber se haviam percebido alguma mudança em sua prática pedagógica após a participação no grupo.

Dentre os professores polivalentes, destaco aqui os depoimentos feitos pelo professor Kennedy, os quais evidenciam o quanto participar desse grupo colaborativo/reflexivo tem influenciado sua prática pedagógica:

Houve uma mudança muito grande. Quando eu faço uma reflexão sobre o meu trabalho, e a minha prática, pensando como eu era e como sou hoje, não consigo pensar em mim apenas como participante de um grupo, mas eu penso na mudança que aconteceu pela participação no grupo e na minha experiência. Eu não consigo imaginar que eu mudei somente pelo grupo ou somente pela experiência. Um complementou o outro. Se eu imaginar estar participando do grupo sem a sala de aula, certamente eu teria crescido, mas de forma diferente e talvez não tanto como eu me desenvolvi. (Kennedy, 2015).

Quando o professor tem a possibilidade de se distanciar para pensar em suas ações, em como foram realizadas ou em como realizá-las novamente, inicia-se uma atitude teórica sobre elas. (SACRISTÁN, 1999, apud MIZUKAMI, 2012).

Foi a busca pelo conhecimento e a necessidade de refletir e repensar a prática pedagógica que aproximou esses professores, estudantes e acadêmicos. As relações construídas nesse grupo vêm permitindo oportunidades de aprendizagem que promovem nos educadores capacidades criativas e reflexivas, permitindo-lhes melhorar sua prática.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os dados mostrados neste artigo trazem evidências sobre a importância dos grupos colaborativos/reflexivos e sobre a prática de ensinar e aprender nas escolas. Esses resultados apontam que grupos como esse são espaços que, por juntar reflexão e discussão entre professores e pesquisadores em diferentes fases da carreira, se tornam espaços potentes de formação.

Ele é potente porque quando a universidade se aproxima da prática pedagógica das escolas, auxilia os professores nas diversas questões pedagógicas referentes à sala de aula e à formação docente. Ao mesmo tempo, para os pesquisadores da universidade, esse contato direto com o professor, que está vivenciando o cotidiano da escola, permite que ações mais diretivas sejam tomadas visando à aprendizagem dos alunos e auxiliando os professores nos desafios enfrentados.

III Encontro Compartilhando em Rede Experiências Educativas e Práticas, em 12 de julho de 2016, na PUC/SP

Identificou-se nesse grupo que as atividades desenvolvidas pelos professores, quando compartilhadas, podem se tornar ricas fontes de aprendizagem, principalmente para os professores que lecionam em uma mesma série ou disciplina. “Os pares são parceiros importantes na aprendizagem docente, principalmente quando se dispõem a compartilhar saberes e práticas, a ouvir e compreender, a analisar sem criticar, a apoiar sem desmerecer.”(TANCREDI, 2009, p. 26).

É importante destacar que a vinda do professor da universidade para a escola tem sido estimulada por programas de políticas públicas e pelos programas de mestrado acadêmico e mestrado profissional e doutorado. A preocupação que existe por parte das universidades em estarem mais próximas das escolas permite que as pesquisas sejam mais direcionadas aos problemas reais dos alunos e dos professores, contribuindo dessa forma com a melhoria do ensino no país.

 

 

 

REFERÊNCIAS

COCHRAN-SMITH, M.; LYTLE, S. The Teacher Research Movement:a decade later. EducationalResearcher, Tallahassee, v. 28, n.7, p.15-25, 1999.

CRECCI, V. M.; FIORENTINI, D.Desenvolvimento profissional de professores em comunidades com postura investigativa. Acta Scientiae, Canoas, v. 15, p. 9-23, 2013.

SACRISTÁN, J. Poderes instáveis em educação. Porto Alegre: Artmed Sul, 1999.

SANTOS, S.; MIZUKAMI, M. G.N.Manifestações de reflexividade em percursos de formação: um estudo longitudinal. In: REALI, A. M.M. R.; MIZUKAMI, M. G. N. (Org.). Desenvolvimento profissional da docência: teorias e práticas. São Carlos: UFSCar, 2012. p.301-332.

TANCREDI, R. M. S. P.Aprendizagem da docência e profissionalização:elementos de uma reflexão. São Carlos:EdUFSCar, 2009. (Coleção UAB – UFSCar).

ZEICHNER, K. Repensando as conexões entre a formação na universidade e as experiências de campo na formação de professores em faculdades e universidades.Educação,Santa Maria, v. 35, n. 3, p. 479-504, set./dez. 2010

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